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quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

OS QUINZE MINUTOS DE CADA UM

QUE EM 2012 A SAÚDE E O SUCESSO
SEJAM SEUS COMPANHEIROS CONSTANTES MAS, ... 


Era uma vez, há muitos e muitos anos, uma escola de anjos. Conta-se que naquele tempo, antes de se tornarem anjos de verdade, os aprendizes de anjos passavam por um estágio.  Durante um certo período, eles saíam em duplas para fazer o bem e, no final de cada dia, apresentavam ao anjo mestre um relatório das boas ações praticadas.
Aconteceu então, um dia, que dois anjos estagiários, depois de vagarem exaustivamente por todos os cantos, regressavam frustrados por não terem podido praticar nenhum tipo de salvamento sequer. Parece que naquele dia o mal estava de folga. Enquanto voltavam tristes, os dois se depararam com dois lavradores que seguiam por uma trilha. Neste momento, um deles, dando um grito de alegria, disse para o outro:
– Tive uma ideia. Que tal darmos o poder a estes dois lavradores por quinze minutos para ver o que eles fariam?
O outro respondeu:
– Você tá maluco? O anjo mestre não vai gostar nada disto! Mas o primeiro retrucou:
– Que nada, acho que ele até vai gostar! Vamos fazer isto e depois contaremos para ele. E assim o fizeram.
Tocaram suas mãos invisíveis na cabeça dos dois e se puseram a observá-los. Poucos passos adiante eles se separaram e seguiram por caminhos diferentes. Um deles após alguns passos depois de terem se separado, viu um bando de pássaros voando em direção a sua lavoura, e passando a mão suada na testa disse:
– Por favor, meus passarinhos, não comam toda minha plantação! Eu preciso que esta lavoura cresça e produza, pois é daí que tiro o meu sustento.
Naquele momento, espantado, ele viu a lavoura crescer e ficar prontinha para ser colhida em questão de segundos.
Assustado, ele esfregou os olhos e pensou: devo estar cansado e acelerou o passo. Aconteceu que logo adiante ele caiu ao tropeçar em um pequeno porco que havia fugido do chiqueiro. Mais uma vez, esfregando a testa disse:
– Você fugiu de novo, meu porquinho! Mas, a culpa é minha, eu ainda vou construir um chiqueiro decente para você.
Mais uma vez espantado, ele viu o chiqueiro se transformar num local limpo e acolhedor, todo azulejado, com água corrente e o porquinho já instalado no seu compartimento. Esfregou novamente os olhos e apressando ainda mais o passo disse mentalmente: Estou muito cansado!
Neste momento, ele chegou a casa e, ao abrir a porta, a taramela que estava pendurada caiu sobre sua cabeça. Ele então tirou o chapéu e, esfregando a cabeça disse:
– De novo, e o pior é que não aprendo. Também, não tem me sobrado tempo. Mas ainda hei de ter dinheiro para construir uma grande casa e dar um pouco mais de conforto para a minha mulher. Naquele exato momento aconteceu o milagre.
Aquela humilde casinha foi se transformando numa verdadeira mansão diante dos seus olhos. Assustadíssimo, e sem na entender, convicto de que tudo era decorrente do cansaço, ele se jogou numa enorme poltrona que estava na sua frente e, em segundos, estava dormindo profundamente.
Não houve tempo se quer para que ele tivesse algum sonho. Minutos depois ele ouviu alguém pedir socorro:
– Compadre! Me ajude! Estou perdido!
Ainda atordoado, sem entender muito o que estava acontecendo, ele se levantou correndo. Tinha na mente, imagens muito fortes de algo que ele não entendia bem, mas parecia um sonho. Quando ele chegou na porta, encontrou o amigo em prantos. Ele se lembrava que poucos minutos antes, eles se despediram no caminho e estava tudo bem. Então perguntando o que havia se passado, ele ouviu o seguinte:
– Compadre, nós nos despedimos no caminho e eu segui para minha casa, acontece que poucos passos adiante, eu vi um bando de pássaros voando em direção a minha lavoura.
Este fato me deixou revoltado e eu gritei:
– Vocês de novo atacando a minha lavoura, tomara que seque tudo e vocês morram de fome! Naquele exato momento, eu vi a lavoura secar e todos os pássaros morreram diante dos meus olhos! Pensei comigo, devo estar cansado e apressei o passo. Andei um pouco mais e caí depois de tropeçar no meu porco que havia fugido do chiqueiro. Fiquei muito bravo e gritei mais uma vez: – Você fugiu de novo? Por que não morre logo e para de me dar trabalho? Compadre, não é que o porco morreu ali mesmo, na minha frente!
Acreditei tá vendo coisas, andei mais depressa e, ao entra em casa me caiu na cabeça a taramela da porta. Naquele momento, como eu estava mesmo era com raiva, gritei novamente: ­– Esta casa... caindo aos pedaços, por que não pega fogo logo e acaba com isto?... Para minha surpresa, compadre, naquele exato momento a minha casa pegou fogo, e tudo foi tão rápido que eu nada pude fazer!
Mas... Compadre, o que aconteceu com a sua casa?... De onde veio esta mansão?
Depois de tudo observarem, os dois anjos foram, muito assustados, contar para o anjo mestre o que havia se passado.
Estavam muito apreensivos quanto ao tipo de reação que o anjo mestre teria. Mas tiveram uma grande surpresa. O anjo mestre ouviu com muita atenção o relato, parabenizou os dois anjos pela ideia brilhante que haviam tido, e resolveu decretar que a partir daquele momento, todo ser humano teria quinze minutos de poder ao longo de sua vida. Só que ninguém jamais saberia quando esses quinze minutos de poder estariam acontecendo.

MORAL DA HISTÓRIA: Muito cuidado com tudo o que você diz, como age e com aquilo que pensa!  Sua mente trabalhará para que tudo aconteça, seja bom ou ruim. Os seus próximos quinze minutos, podem ser os seus quinze minutos de poder.


SONETO À LUA

POR QUE TENS, por que tens olhos escuros
E mãos lânguidas, loucas e sem fim
Quem és, quem és tu, não eu, e estás em mim
Impuro, como o bem que está nos puros?

Que paixão fez-te os lábios tão maduros
Num rosto como teu criança assim
Quem te criou tão boa tão boa param o ruim
E tão fatal para os meus versos duros?

Fugaz, com que direito tens-me presa
A alma que por ti soluça nua
E não és Tatiana e nem Teresa:

E és tão pouco a mulher que anda na rua
Vagabunda, patética, indefesa
Ó minha branca e pequenina Lua!

Vinícius de Moraes, Rio 1938

DATA VENIA

É do estreito vão da janela que a pequena
cessa de cantarolar
que alguma coisa era de vidro e se quebrou
E dentro de alguns desencantos,
um passarinho enfurnado na gaiola
canta ofegante a prisão de um tempo,
enquanto o mundo afirma seus poderes
de grandeza do lado de fora.

O homem que foi retratista numa terra
de ninguém engoliu seu mar perfeito, quadradinho...
Eu penso em versos tão tristes...
Serão eles exraizados
daqueles atalhos das voltas que o mundo dá?

A vida calada nas coisas por um verso bendito,
me distrai, mas também indagador e atrevido:

Até onde posso de mim?
Terei eu algum dia um lugar na prateleira
do mundo?

Pois que num recanto de primeiro andar
um caroço se aninha na fruta,
em estado de miolo, abraçado, vivo.
Com uma vontade a sovar o pão de livro
no aguardo de uma próxima fornalha.

Marta Eugênia

ENCONTRO

Vasculhei todos os cômodos
e nem sei o que procuro.
Mas certa vez procurava um livro
e enquanto ele não se inventou perante os olhos,
traços de forma, cor e textos respiravam
em minha mente.
Muitas vezes não entendo raízes, não manuseio bem a língua,
cato ressurreições e sonego escolhas...
e é dentro de joias simples que a vida se diz incógnita.
Perco coisas dentro de minha casa
e é claro que as encontrei.
No caso do livro, esqueci-o por algum tempo,
atendi solicitações da casa e lavei a louça, reguei o jardim
e assim que abri a gaveta pra pegar a tesoura
e cortar nem lembro o quê,
lá estava ele, o livro que me achou.

Marta Eugênia

O DIA DA CAÇA

Porque o mundo se oferece em línguas,
eu fico assim... enraizada de mar profundo,
a parte de dentro latente, os olhos compromissados de estrelas
pra dentro e pra fora.
Era apenas o estalar da fogueira que nos aquecia
naquela noite?
Não era somente o meu pai na varanda
fumando o cigarro e a paciência do mundo.
Nem tampouco minha avó ungindo o cabelo
e deixando inusitado o mesmo penteado das cinco.
Era o saco de minhas coisas expandindo-se:
“veja moça, que belo baú”, me disse o homem da feira,
logo pela manhã
nasceu instantes depois a mulher que me ofereceu acerolas:
tão vermelhas, tão pequenas e tão cheias de potencial!
Têm muque pra várias laranjas
Deus, como é invencível a vida! Como essa guerra cheira a ti.
veja quanta proteína pra sustentar a poesia.
Como a vida me rói, me põe indômita.
A poesia me caça com seu franco atirador.

Marta Eugênia

A NOTÍCIA

Lembram pedaços de vidro,
assim, contra a luz do poste,
os pingos que o céu empurra.

A pressa denunciada pelos toques
dos sapatos contra o piso,
me instiga a descer a rua
agarrada com meus livros:

Veio-me deles a mania de buscar nomes pra tudo?
causou-me tanta estranheza o nome “mancebo”
na revista de arquitetos...

Procuro um nome pra’s minhas pressas
e ele se agacha por trás dos muros
pra não por culpa no bilhete.
A noite aconselha casacos, meias grossas,
caldos quentes e o frio não cessa.

Um homem poda uma roseira, quando quer...
E àquela hora da noite...

Vem do governo interno do mar
o meu medo dos escombros,
do governo profundo da noite
o meu gosto por agasalhos
as minhas pressas preciosas,
a minha mobília pesada e escura.

Marta Eugênia

BEM-ME-QUER, BEM-ME-QUER, BEM-ME-QUER

Um poema não desce pra perguntar
quem poluiu o chão e o ar
quem enxotou os animais daqui pra lá
ou quem transportou tantas árvores
pra estação do adeus.
Os poemas aparecem
pra afirmar que no céu ainda resta algum azul,
que as ondas com suas pernas de espuma
trazem à praia
alguns segredos da alma do mar:
conchas, búzios, mariscos,
coisas que não se contam
a qualquer um...
Mas eu pergunto:
Quem compreende uma dália
no assunto de uma tarde?
Quem enxerga que as acácias,
gérberas, rosas, lírios,
brincam nos terreiros de cada dia?
A poesia, a poesia, a poesia.

Marta Eugênia

O ANEL DE PEDRA VERDE OU A SALVAÇÃO

É possível acontecesse.
E este poema bem cabe em existências
que inventei:
uma pequena senhora se perdeu
do antigo expresso
Um homem de deus foi de perder a cabeça
e uma cigana perdeu nas mãos
o juízo de uma vez

eu devia mesmo era perder
o tonto medo de escuro
assim, como se perde um recado na mente
que, desconecto, não tem mais onde voltar
Mas não como se perde um documento
o qual requer segunda via

Um livro de poemas não deve nunca ficar
em algum lugar esquecido
para tirar de letra.
Pois que um livro assim fechado
enfrenta lá seus escuros...

Qual é mesmo a via que me desvia
de uma verdade em botão?

Desconheço o alinhavo como quem prendeu um dedo
numa agulha da infância,
de onde vem tal maldição.
Não era uma vez um medo e uma escuridão.
Eram várias as vezes
Mas também era outra vez... Um plano quieto,
um laço de fita na ponta dos pés
de uma boneca que pensava ser de pano...
E um poema que acendeu a luz quarto.

Marta Eugênia

ENREDO PARA UMA VOLTA

A poesia é simples, minha cabeça, complicada,
e ela me cede a outra face
por causa dos novos tempos.
Mal conheci o colo de meu pai
e o amo profundamente...
meus olhos saltavam em poesia
vendo-o preparar um cigarro
e olhar minha mãe desmanchando o crochê.
Mais do que em qualquer outro lugar
ela desidratava pelos olhos,
excelente ocidental, era a minha mãe,
sentiu-se bastarda também de Deus:
casou-se com meu pai de papel passado e tudo.
Saí de casa com os olhos amanhecendo
pra conhecer o mundo, o sexo e o que dele vem.
Fui devolvida. Absolvida. Recados vacantes.
Insistentes.
Freud.

Marta Eugênia

ENTRE A FLOR E O ESPINHO

Não sou eu que invento os versos, não crio poesias,
é a poesia que se inventa pra mim, atormenta meus ouvidos
e anuncia seu corpo móvel no papel, me manda recados,
diz que eu preciso de ócio em nome da minha paz.
O pão de cada dia que devo percorrer
me enche de angústia e ansiedade
e a poesia me vence, perco a hora, não participo dos ritos,
ganho sermões maternos.
E quando choro, me agradam com conselhos
do mundo capital.
Invento remorsos para não magoar os meus.
As tarefas me cobram cuidados, o mundo me pede cuidados,
mas é a poesia quem cuida de mim.

Marta Eugênia

POEMA CONDICIONAL

Se eu tivesse um verso agora
o que poderiam as daninhas
contra mim ou a favos?

Se eu tivesse um verso agora
esta falta de sementes no horizonte,
estes papéis cabisbaixos, estas tontas ruas,
estas pernas quietas e ombros
não me manteriam calada, sem par,
sem tambores para as mãos,
sem eira nem beira. Sem.

O que sinto é um verso sem língua,
a poesia sem boca
que não rima com palavras
e me torce a alma e aprimora os modos
de vir ao chão medos incalculáveis.

Como resolver as dobras? Como espantar os escuros
e destampar o vão da noite para o dia clarear?
Se eu tivesse um verso agora
eu seria as palavras certas que nem lembrei.

Marta Eugênia

TENTATIVAS NO ANZOL

O velho pescador puxa o anzol
Sua sede de peixe explica-se no rio.
Com as palavras eu puxo uma infância:
noites de lua cheia e cantigas de roda.
Só a infância não teme o mundo
porque só ela é gerúndio de fé e sabe brincar.

Marta Eugênia

RECESSO

Entro no quarto, empurro a porta
e a dobradiça fala em chiados,
meu coração também chia
da tristeza mais bonita...
A colcha é de lã é verde como meus sete anos.
A fumaça do candeeiro dança em busca do teto
e a minha caneta dança aqui neste poema.
É lá que estou agora e me retiro em mais de quinze anos
do poço de água salobra.

Marta Eugênia

HIATO

Algumas amigas de minha infância
e que perduram por lá
– porque é a terra que gira em torno do sol –
conseguiam comê-las.
Eu não. Já sabia fazer cara de nojo.
Mas me dava muito bem com o refrão:
“cai, cai tanajura na panela de gordura”.
O refrão às vezes se canta pra mim
acima ou abaixo da melancolia
e aquela cara de nojo se meteu em outras ordens
Não era nojo mesmo, hoje sei.
já era hiato.

Marta Eugênia

ARRANJO DE MARGARIDAS

Não, não posso deixar para trás
os passarinhos do mundo,
ou borboletas batendo a vida nas asas
sobrevoando o chão inerte.

Os olhos amarelos das margaridas
espiam-me atentos...
A brancura das pétalas
que simulam um redondo sorriso,
parece adivinhar os versos,
onde o instante é o cais...

Debruçam enfim, as palavras na janela,
em espelhos olhando pra mim
e a promessa comprida do dia
de que me valerá a manhã.

Marta Eugênia

AS DUAS POSES

A primeira fotografia tinha faces duras:
O rosto liso, sério e seco.
Não parecia amargo. Porém duro.
Dessas durezas que a vida explica
e o coração dos outros não compreende.
Na segunda fotografia havia doçura...
Mas era de segunda mão.

Marta Eugênia

DA VISÃO POÉTICA

Naquela tarde um velho fez um sentimento pra mim:
Completamente sentado na cadeira de balanço.
E tranquilo como as folhas e as árvores,
Recebia o vento soprando uma paz
Pra lá e pra cá.
Sem uma palavra sequer a vida vinha
Com uma verdade:
a poesia que o dia escreveu pra mim.

Marta Eugênia

A FILHA DA ANTIGA CASA

Não posso renunciar-me a certas memórias,
caracteres que também formam meu rosto:
Os olhos miando de frente pro peito aberto do mar
que só conheceu depois de setenta...
Nem era setembro – mês que as destaladeiras
se punham a cantar de tanta promessa –
e a cadeira da varanda
sustentava seu corpo de pernas cruzadas
na calvície da tarde.
no horizonte, a linha azul tinha muito pra contar,
ruas pra se avistar...
De vez em quando meu pai me dá esse tablete
de vida lembrada
pra eu comer, aquecer meu verso e engordar meu
peito.

Marta Eugênia

CERTAS COISAS NA JANELA

Meu pai, homem de poucas palavras
possuía uma certa ingenuidade cabocla,
mas nós víamos bússola em seus olhos
Lembro-me de suas risadas
Quando pra ele eu lia sobre um “auto” e uma “compadecida”
Logo depois, falávamos de nossa terra:
Histórias de “João Cambão”, “costela do cão”
que passava na rua e a criançada gritava em refrão:
“João Cambão, costela do cão
que trocou a mulher por um pedaço de pão!”...
Certas coisas na janela sempre voltam quando abro a janela.

Marta Eugênia

DEVERAS

É tão e ainda aceso em mim o teu nome.
E grita tremulando a noite
qual luzes da cidade grande
grande ...
ainda é o que sinto...
Quem dera eu pudesse tecer um poema
que atingisse os teus nervos
e te pusesse em estado de pássaro...
Tal é a minha vontade de teu rosto calmo
tal é a minha vontade de convidar-te
aos meus anéis de pedra verde, arrumados
naquilo que não tem idade,
tal é a minha vida longe de tua emaranhada
rotina
tal é esta moldura em que vivo
à espera d teu retrato
tal é este poema que recorre ao nome
que só está em ti.

Marta Eugênia

PREFERENCIAL

Pessoas não param por “bobagens”
que o dia chama de “comum”:
Um suposto homem sem gravata num café
ou uma rosa possível explicando um jardim.
Para se conseguir os olhos de algumas pessoas,
faz-se jus que a rosa funcione em espinhos
ou o café preto derrame na mesa branca, quieta.
Assim, pessoas param pra ver o relógio diferente
ou sensacional.
E o cotidiano continua com seu jeito óbvio,
suas pernas simples e sóbrias.
Mas não para certas pessoas.

Marta Eugênia