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sábado, 1 de setembro de 2012

AS TRÊS GERAÇÕES DO ROMANTISMO BRASILEIRO


ROMANTISMO (PRIMEIRA GERAÇÃO)

 

HISTÓRICO (RESUMO)



O livro Suspiros Poéticos e Saudades, de Gonçalves de Magalhães (1811-1882), publicado em 1836, é tido como marco fundador do Romantismo no Brasil. Em torno e sob liderança de Magalhães, um grupo de homens públicos e letrados articulou as primeiras manifestações do Romantismo no Brasil, num momento caracterizado pela tentativa de definição de uma identidade nacional.
O fervor patriótico do grupo, integrado por Martins Pena (1815-1848), Francisco Adolfo Varnhagen (1816-1878) e João Manuel Pereira da Silva (1817-1895), entre outros, manifestou-se inicialmente por meio da imprensa. O primeiro veículo de divulgação consciente do ideário romântico foi a revista Niterói, que teve entre seus colaboradores Gonçalves de Magalhães, Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879), Francisco Sales Torres-Homem (1812-1876) e C. M. de Azeredo Coutinho. No período, destaca-se também a revista Guanabara, dirigida por Porto-Alegre, Gonçalves Dias (1823-1864) e Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882).
Foi à poesia, porém, que coube o papel de consolidação do Romantismo no país. Mais especificamente a Gonçalves Dias, poeta mais representativo da primeira geração do movimento. Em poemas de temática indianista, como I- Juca Pirama, ou patriótica, como Canção do Exílio, ele empregou temas caros aos autores românticos, como saudade, melancolia e natureza.
 

ESTILO - CARACTERÍSTICAS GERAIS

A primeira fase do Romantismo brasileiro, compreendida entre os anos de 1836 e 1852, caracterizou-se pela busca de definição de uma identidade nacional. Reunidos em torno de Gonçalves de Magalhães, cuja obra Suspiros Poéticos e Saudades, de 1836, é tida como marco fundador do movimento no Brasil, um grupo de homens públicos e letrados articulou a formação de um clima de opinião favorável à autonomia cultural do país. O processo de emancipação desencadeado daí em diante deve ser entendido, no plano cultural, como o equivalente da independência política, conquistada em 1822.
O fervor patriótico desse grupo, integrado por Martins Pena, Francisco Adolfo de Varnhagen e João Manuel Pereira da Silva, entre diversos outros, manifestou-se inicialmente por meio da imprensa, que desde a chegada de D. João VI, em 1808, tomava impulso no país. Nas três primeiras décadas do século XIX, foram fundadas dezenas de jornais e revistas, a maioria de duração efêmera. Mas a proliferação desses periódicos, geralmente dedicados à política, literatura e ciências, exprime a urgência e o anseio de expressar e fazer circular publicamente o conhecimento e a opinião.
A revista Niterói, fundada em 1836 por Gonçalves de Magalhães, Manuel de Araújo Porto-Alegre, Francisco Sales Torres-Homem e Azeredo Coutinho, participa desse contexto de florescimento da imprensa. A publicação, também de cunho científico, literário e artístico, foi fundada em Paris e tinha como epígrafe a frase "Tudo pelo Brasil e para o Brasil", e foi a primeira a promover a difusão consciente do Romantismo no país. O programa de reforma e nacionalização da literatura brasileira, veiculado por artigos e estudos publicados na revista, tinha origem nas idéias do escritor português Almeida Garrett e do historiador francês Ferdinand Denis (1798 - 1890), pioneiro no estudo da literatura brasileira.
Dois anos mais tarde, em 1838, a fundação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) representaria outro passo importante para a consolidação do movimento no Brasil. O Instituto tinha como objetivo a produção de estudos sistemáticos de aspectos variados da realidade nacional e congregou as principais figuras da intelectualidade brasileira da época, entre as quais J. M. Pereira da Silva e Joaquim Manuel de Macedo, que foi sócio-correspondente do IHGB. Parte das pesquisas realizadas pelos integrantes do grupo era publicada na revista da instituição, que foi de extrema importância para a divulgação do ideário Romântico no país.
Outras duas publicações contribuem de modo significativo para a sedimentação do movimento nessa primeira fase. São elas o jornal Minerva Brasiliense e a revista Guanabara. O primeiro durou dois anos - de 1843 a 1845 - e merece destaque pelos nomes que nele atuaram: tinha entre seus colaboradores Gonçalves de Magalhães, Odorico Mendes, Santiago Nunes Ribeiro e Teixeira e Sousa (1812-1861). Foi esse jornal que deu origem à revista Guanabara, editada entre os anos de 1850 e 1855. Dirigida por Porto-Alegre, Gonçalves Dias e Joaquim Manuel de Macedo, a revista exemplifica a organicidade do Romantismo brasileiro nesse primeiro momento, explicitando em seu artigo de apresentação o vínculo direto com as publicações que a antecederam.
No campo da prosa de ficção, as primeiras experiências românticas no Brasil estão bastante calcadas no romance europeu. A partir da década de 1830, traduções da obra de autores como Walter Scott, Chateaubriand e Balzac começam a ser publicadas nos jornais num formato que teria extrema popularidade no século XIX: o folhetim. A tentativa de se criar um "romance nacional" tem início nessa época. O Filho do Pescador (1843), de Teixeira e Sousa, é o primeiro passo nessa direção. Já no ano seguinte aparece A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo. Para o crítico e historiador Antonio Soares Amora, esses livros inauguram duas tendências importantes da ficção romântica: a histórica e a urbana.
 

AUTORES
Entre os autores da Primeira Geração do Romantismo, o mais empenhado em articular a reforma romântica e nacionalista na literatura foi Gonçalves de Magalhães, que se dedicou à poesia, ao teatro, à ficção, à história e à elucubração filosófica. No campo literário, sua obra mais importante é Suspiros Poéticos e Saudades, lembrada como marco inaugural do Romantismo. Mas a importância histórica de Magalhães deve-se principalmente à figura centralizadora, que estimulou e coordenou a reforma romântica.
Indicativos de seu papel de reformulador são os ensaios Discurso Sobre a História da Literatura do Brasil e Filosofia da Religião, ambos publicados na revista Niterói em 1836. No primeiro texto, Magalhães argumenta que o Brasil possui uma literatura ligada à evolução histórica do país e que, portanto, apresenta objetos dignos de inspirar escritores. No segundo, afirma que a religião é um dos elementos básicos da sociabilidade e deve, em conseqüência, ser tema de produções artísticas. O intuito era mostrar a literatura como espírito da evolução histórica do país, e o mérito do texto está em postular a necessidade de se estudar os escritores brasileiros do passado para definir a continuidade com o presente. A religião seria o liame capaz de estabelecer a conexão com os antecessores.
Pereira da Silva e Santiago Nunes Ribeiro também produziram textos de importância para a consolidação do movimento. No segundo número da mesma Niterói, Silva publicou Estudos Sobre a Literatura. Nesse texto, ele retoma os temas de Magalhães e argumenta que o Brasil tinha necessidade de manifestar uma literatura própria, o que requer rejeição da imitação clássica e atenção às inspirações locais. Foi ele o primeiro a apontar o Romantismo como guia para se levar esse projeto adiante. Já Nunes Ribeiro é autor do ensaio Da Nacionalidade da Literatura Brasileira. Publicado no jornal Minerva Brasiliense, o texto defende a tese de que a literatura nacional existe desde os primeiros autores do período colonial, de muita consequência para futuras elaborações teóricas sobre a independência da literatura brasileira em relação à Europa.
Autor de A Moreninha (1844), O Moço Louro (1845) e Os Dois Amores (1848), entre muitos outros, Joaquim Manuel de Macedo é o prosador de maior destaque nesta fase inicial do Romantismo. Até porque José de Alencar, em todos aspectos o nome mais importante da prosa romântica brasileira, ainda não tinha começado a carreira literária. Também autor de poemas e de doze peças de teatro, Macedo atuou como cronista no Jornal do Commercio, onde mantinha a coluna A Semana. Como ficcionista, foi o primeiro autor a transpor os tipos, as cenas, a vida da sociedade do Rio de Janeiro para o gênero romance - o que era novidade no país.
Macedo obteve grande popularidade ao abordar cenário e personagens familiares para os leitores cariocas, ao descrevê-los de maneira ligeira, sentimental e novelesca, tal como prescrevia o modelo folhetinesco francês. "Realidade, mas só nos dados iniciais; sonho, mas de rédea curta; incoerência, à vontade; verossimilhança, ocasional; linguagem, familiar e espraiada: eis a estética dos seus romances", define Antonio Candido (1918) no livro Formação da Literatura Brasileira.
Foi à poesia, porém, que coube o papel de consolidação do Romantismo no país. Mais especificamente a Gonçalves Dias, o poeta mais representativo da primeira fase do movimento. Em poemas de temática indianista, como I- Juca Pirama, ou patriótica, como Canção do Exílio, ele transformou em experiência o que antes era apenas tema. A transformação fica evidente ao se comparar O Dia 7 de Setembro, de Gonçalves de Magalhães, com a Canção do Exílio, de Gonçalves Dias. O assunto comum - o amor e a saudade da pátria - é abordado em tom protocolar e oficial no poema de Magalhães, ao passo que Gonçalves Dias harmoniza rigor formal e sentimento num poema ainda hoje capaz de fazer vibrar as cordas do amor pelo país natal.
Graças à complexidade dos recursos formais empregados por Gonçalves Dias, saudade, melancolia, natureza, índio, enfim, toda a galeria temática do Romantismo ganha significado para além da tentativa de se fazer um mero registro da realidade do país.

Atualizado em 23/06/2010

 


 
ROMANTISMO (SEGUNDA GERAÇÃO)

 
HISTÓRICO (RESUMO)

A segunda geração do Romantismo tem seus traços mais facilmente identificáveis no campo da poesia e seu marco inicial é dado pela publicação da poesia de Álvares de Azevedo (1831 - 1852), em 1853. Em vez do índio, da natureza e da pátria, ganham ênfase a angústia, o sofrimento, a dor existencial, o amor que oscila entre a sensualidade e a idealização, entre outros temas de grande carga subjetiva. Exemplares desse período são as obras de Fagundes Varela (1841 - 1875), Casimiro de Abreu (1839 - 1860) e Álvares de Azevedo (1831 - 1852).
Em 1856, com a polêmica em torno no poema A Confederação dos Tamoios, de Gonçalves de Magalhães (1811 - 1882), ganha expressão a figura de José de Alencar (1829 - 1877), o mais importante prosador do Romantismo brasileiro. Nas objeções que faz a Magalhães, Alencar manifesta sua posição a respeito das correntes nacionalistas e delineia o programa de literatura indianista que seguiria nos anos seguintes. As premissas de O Guarani (1857), Os Filhos de Tupã (1863), Iracema (1865) e Ubirajara (1874) estão formuladas nos artigos escritos a propósito da polêmica.
A ficção com ambientação urbana toma corpo neste período. Iniciada com A Moreninha, de Macedo, a linhagem tem continuidade com Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida. Publicado em folhetim entre 1852 e 1853, o livro pode ser lido como uma reação aos hábitos inspirados no "refinamento" da corte. Assim como os livros de Macedo, foi sucesso de público e contribuiu para a criação do romance brasileiro.
Bernardo Guimarães (1825 - 1884), Varnhagen, Pereira da Silva, Luiz Gama (1830 - 1882), José Bonifácio e Machado de Assis (1839 - 1908) também tiveram participação importante na produção intelectual do período. Além das atividades como poetas ou romancistas, eles protagonizaram o debate de idéias, geralmente veiculado pela imprensa, de fundamental importância para a consolidação da literatura no Brasil.

 
ESTILO - CARACTERÍSTICAS GERAIS

A publicação do livro Poesias, de Álvares de Azevedo, em 1853, é considerada por parte da crítica como marco inicial da segunda geração do Romantismo no Brasil. Essa geração, cujos maiores expoentes são Álvares de Azevedo, Fagundes Varela e Casimiro de Abreu, tem a marca do ultra-romantismo. A angústia, o sofrimento, a dor existencial, o amor que oscila entre a sensualidade e a idealização são alguns dos temas de grande carga subjetiva que tomam o lugar do índio, da natureza e da pátria, dominantes na geração anterior.
Essa exacerbação da sentimentalidade e das fantasias da imaginação mórbida exige uma versificação mais livre, menos apegada a esquemas formais preestabelecidos, e define as obras poéticas de maior impacto do período, como Um Cadáver de Poeta, de Álvares de Azevedo.
Inspirados pelo inglês Byron, pelo italiano Giacomo Leopardi e pelos franceses Alphonse de Lamartine e Alfred de Musset, os poetas da segunda geração escrevem poemas que sugerem uma entrega total aos caprichos da sensibilidade e da fantasia, abordando temas que vão do vulgar ao sublime, do poético ao sarcástico e ao prosaico. A morte precoce ajudou a compor a mística em torno desses poetas de inspiração byroniana, que não raro fazem apologia da misantropia e do narcisismo, cultivam paixões incestuosas, macabras, demoníacas e mórbidas.
No campo da crônica e da prosa jornalística de maneira geral, talvez seja mais adequado considerar 1856 como o momento de transição para a segunda geração romântica. Nesse ano foi publicado A Confederação dos Tamoios, poema épico de Gonçalves de Magalhães que deu início à polêmica mais importante do movimento, travada justamente entre os defensores de Magalhães e o mais expressivo prosador do Romantismo: José de Alencar.
O assunto abordado pelo poeta é a rebelião dos tupis contra os portugueses ocorrida no Rio de Janeiro no século XVI, com destaque para a figura do chefe Aimbire, transformado em símbolo de resistência do homem americano. Impresso às custas do Imperador Pedro II, o poema era expressão acabada da literatura oficial. Em parte por essa razão, José de Alencar, recém-iniciado na carreira literária, manifestou-se publicamente sobre o texto. Escreveu diversos artigos, assinados sob o pseudônimo Ig, em que denunciava a inferioridade da realização do poeta ante a magnitude do objeto. Porto-Alegre, Monte Alverne e, num caso único no país, o próprio Imperador, saíram em defesa do poeta. Alencar, por sua vez, foi secundado por Ômega, pseudônimo do jornalista Pinheiro Guimarães.
É nesse momento que se articula uma faceta importante do projeto literário de Alencar. Nas objeções que faz a Magalhães em seus artigos, Alencar manifesta sua posição a respeito das correntes nacionalistas e delineia o programa de literatura indianista que seguiria nos anos seguintes. As premissas de O Guarani (1857), Os Filhos de Tupã (1863), Iracema (1865) e Ubirajara (1874) podem todas ser extraídas dos textos escritos a propósito da polêmica. "A crítica dos criadores é muitas vezes programa; examinando outros escritores, procuram ver claro neles mesmos", escreve Antonio Candido (1918) respeito desse episódio. Cabe notar que a discussão em torno do livro A Confederação dos Tamoios revela ainda a existência de uma dimensão pública para o debate literário, praticamente inexistente nos períodos anteriores e que ganha impulso com a expansão da atividade da imprensa.
Além de Alencar, outros autores, entre eles Dutra e Melo, Junqueira Freire, Álvares de Azevedo e Franklin Távora (1842 - 1888), contribuem para o adensamento da atividade crítica nesse momento. Em publicações como Nova Minerva, Correio Paulistano e Atualidade, eles produzem ensaios, prefácios e artigos que atestam a importância do momento para o estabelecimento definitivo de uma crítica literária no país.
Paralelamente a isso, Pereira da Silva, Antônio Henriques Leal, Varnhagen, entre críticos, eruditos e professores de origem diversa, reúnem textos, editam antologias, pesquisam biografias, redescobrem autores brasileiros do passado, vão, enfim, tornando possível a principal aspiração do Romantismo no plano da crítica: elaborar uma história literária que exprimisse a imagem da inteligência nacional na seqüência do tempo. No entanto, só a partir de 1880, com a publicação da História da Literatura Brasileira, de Sílvio Romero (1851 - 1914), esse processo ganharia uma síntese de grande expressão.
Além do indianismo, outras vertentes temáticas características da prosa romântica tomam corpo. A urbana, por exemplo. Iniciada com A Moreninha, de Macedo, essa linhagem tem continuidade por meio de uma das melhores obras do período: Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida. Publicado em forma de folhetim entre 1852 e 1853, o livro pode ser lido como uma reação ao esnobismo afrancesado, aos hábitos inspirados no "refinamento" da corte. Ambientada no tempo de D. João VI, a história criada por Almeida centra foco nos estratos mais baixos da sociedade. Assim como os livros de Macedo, foi sucesso de público e teve contribuição importante para a criação de uma ficção brasileira original.
Dois anos depois da publicação da obra de Manuel Antônio de Almeida, Alencar começa a carreira literária. Seus primeiros livros, Cinco minutos e Viuvinha, publicados em folhetim em 1856 e 1857 no Diário de Rio de Janeiro, definem as fórmulas dos "perfis femininos" e dos "quadros de sociedade", segundo a definição do crítico Antônio Soares Amora. Ambos pertencem à temática urbana, da qual ainda fariam parte Lucíola (1862), Diva (1864), A Pata da Gazela (1870), Sonhos D?Ouro (1872) e Senhora (1875).

 
AUTORES

José de Alencar, Álvares de Azevedo, Bernardo Guimarães, Varnhagen, Pereira da Silva, Luiz Gama (1830 - 1882), José Bonifácio, Machado de Assis. São esses alguns dos autores que produziram textos importantes para a formação da consciência literária do período. Geralmente voltados para atividades literárias de outro teor, como a poesia e o romance, eles protagonizaram um debate de idéias, no mais das vezes veiculadas pela imprensa, de importância fundamental para a consolidação da literatura no Brasil.
Poeta mais destacado da segunda geração romântica, Álvares de Azevedo é autor de alguns dos poemas mais ilustrativos desse Romantismo calcado nos dramas da subjetividade, no pessimismo e na obsessão pela morte, presente em títulos como Um Cadáver de Poeta, Se Eu Morresse Amanhã e Lembrança de Morrer. Ele também é autor de dois ensaios importantes, Jacques Rolla e Literatura e Civilização em Portugal, escritos entre 1849 e 1850. Em ambos, discorre principalmente sobre sua concepção do belo e tece considerações sobre psicologia literária. Apesar de morto antes de completar vinte e um anos, deixou nesses textos, assim como na excelente obra poética que realizou, uma consciência aguda dos problemas estéticos de seu tempo.
Varnhagen e Pereira da Silva são autores de alguns dos compêndios mais importantes do período. O Florilégio da Poesia Brasileira (1850-1853), de Varnhagen, é a antologia de literatura mais rica de seu tempo. Foi a que proporcionou pela primeira vez um conjunto de poemas de Gregório de Matos (1636 - 1696), cuja descoberta se deve ao Romantismo. Pereira da Silva, por sua vez, tem importância pela pesquisa biográfica que realizou. Em 1856, publicou Varões Ilustres do Brasil Durante os Tempos Coloniais, compêndio de vinte biografias de importantes intelectuais brasileiros cujo modelo era inspirado na obra do historiador romano Plutarco.
Bernardo Guimarães (1825-1884) é outro nome importante do período. Em São Paulo, conviveu com Álvares de Azevedo, Aureliano Lessa e José Bonifácio, o Moço. Entre 1858 e 1861 viveu no Rio de Janeiro, onde trabalhou como jornalista e crítico literário do jornal Atualidade. Nesse momento, a defesa de idéias republicanas e mais tarde anti-escravistas começa a tomar forma consistente. Alguns de seus principais defensores, como José Bonifácio, o Moço (1827-1886), e Luiz Gama (1830-1882), foram também importantes cronistas do período.
Bonifácio, por exemplo, foi diretor do jornal Ipiranga e colaborador em A Tribuna Liberal, de Inglês de Souza (1853 - 1918), no Rio de Janeiro. Além de deputado e senador, foi professor na Faculdade de Direito de São Paulo, onde teve como alunos Rui Barbosa (1849 - 1923), Castro Alves (1847 - 1871), Joaquim Nabuco e Afonso Pena. Gama, por sua vez, foi fundador do jornal Diabo Coxo. O periódico era ilustrado pelo italiano Angelo Agostini e é considerado marco da imprensa humorística em São Paulo. Entre 1864 e 1875, Luiz Gama colaborou nos jornais Ipiranga, Cabrião, Coroaci e O Polichileno. E fundou, em 1869, o jornal Radical Paulistano, com Rui Barbosa.
Até Machado de Assis (1839-1908), maior prosador do Realismo brasileiro e geralmente identificado com o período posterior ao Romantismo, exerceu atividade influente na imprensa nas décadas de 1850 e 1860, antes de estrear como romancista em 1872. Machado começou a trabalhar aos 16 anos como tipógrafo aprendiz da Imprensa Nacional. Aos 18, entrou na tipografia de Paula Brito, que publicava o jornal A Marmota Fluminense, que em 1855 estampou um de seus primeiros poemas, Ela. Nos anos seguintes trabalhou como cronista, crítico literário e teatral de vários jornais, entre eles Correio Mercantil, Ilustração Brasileira e Gazeta de Notícias.

Atualizado em 23/06/2010

 


 

TERCEIRA GERAÇÃO ROMÂNTICA: CASTRO ALVES (1847 – 1871)

Nascido no Estado da Bahia, na cidade que hoje leva seu nome, Castro Alves fez seus primeiros estudos em Salvador, junto com o colega Rui Barbosa. Estudou na Faculdade de Direito do Recife, onde se juntou a Tobias Barreto e participou ativamente da vida literária acadêmica. Já na adolescência, Castro Alves produzia precocemente seus primeiros versos, começando, na Faculdade, a alcançar notoriedade. Tinha uma vida amorosa intensa, da qual se pode destacar o romance com a atriz Eugênia Câmara, que lhe rendeu boa parte dos seus versos líricos. Em viagem para o sul do país com a atriz, Castro Alves conhece José de Alencar e Machado de Assis. Matricula-se no 3º ano da Faculdade de Direito de São Paulo, na mesma turma que Rui Barbosa. O rompimento com Eugênia deixa o poeta desolado e, mais uma vez, juntam-se à sua obra lírico-amorosa intensos e dolorosos versos. Para esquecer a perda, o poeta distrai-se em caçadas e em uma delas fere o pé com um tiro de espingarda, o que o leva a amputá-lo. Bastante debilitado, a tuberculose que se manifestara já no ano de 1863, quando o poeta tinha apenas dezesseis anos, agravou-se, o que leva Castro Alves a voltar para a Bahia, hospedando-se em fazendas de parentes, em busca de melhora. Neste período, cuida da edição de seu primeiro livro, único a ver publicado: Espumas Flutuantes. Morre um ano depois desta publicação, em 1871, com 24 anos.
 “Vulgarmente melodramático na desgraça, simples e gracioso na ventura, o que constituía o genuíno clima poético de Castro Alves era o entusiasmo da mocidade apaixonada pelas grandes causas da liberdade e da justiça — as lutas da Independência na Bahia, a insurreição dos negros de Palmares, o papel civilizador da imprensa, e acima de todas a campanha contra a escravidão”, assim falou de Castro Alves o também poeta Manuel Bandeira. Fortemente influenciado por Victor Hugo, bem como pela nova condição do Brasil, que aos poucos deixava de ser puramente rural para se urbanizar, o que levou ao desenvolvimento de ideais democráticos e o de repulsa pela “moral do senhor-e-servo”, Castro Alves foi inovador justamente pelo seu epos libertário. Além disso, original na obra do poeta será também os seus versos de substância amorosa pela franqueza e realismo no exprimir das paixões e desejos e na descrição erótica da mulher.
Na poesia social, humanitária e nacionalista, Castro Alves exibe toda a sua eloquência épica. Seus versos de temática social, de tom oratório e de excepcional comunicabilidade, aproximam-se da retórica, esquecendo-se, verdade seja dita, por vezes, nela mesma, acabando em verborragia vazia, ancorada em combinações sonoras sem nexo. Esse exagero advém das influências de sua época, da qual a oratória era a menina dos olhos. Mas, se por um lado o jovem poeta abusou forçosamente da superposição de imagens e de aposições, pecando, ocasionalmente, pelo excesso e mau-gosto, por outro, ele soube, com esses e outros recursos, alcançar, nas palavras de Manuel Bandeira, “a maior força verbal e a inspiração mais generosa de toda a poesia brasileira”.
Vale lembrar que o tom oratório dos versos de Castro Alves deve-se a um propósito pragmático dos seus cantos, o de alcançar multidões. Seus poemas são escritos com a intensão de serem declamados em praça pública, teatros e grandes salas, como verdadeiros discursos. É essa a missão do poeta, a de anunciar a todos o “Novo Mundo”, a de persuadir a todos da necessidade de mudança. Daí a épica retumbante de seus versos, as apóstrofes violentas, as antíteses constantes, as hipérboles e metáforas ousadas, enfim, o tom grandiloquente de seus cantos.
Inspirado por Victor Hugo, Castro Alves foi o arauto da liberdade e da justiça. Envolvendo-se em todos os acontecimentos históricos de sua época, foi vate e profeta ao anunciar a abolição da escravatura e a instauração do regime republicano.
De sua poesia social, destacam-se dois longos poemas com os quais, segundo Manuel Bandeira, Castro Alves atingiu “a maior altura de seu estro”: “Vozes d’África” e “O Navio Negreiro”, ambos pertencentes ao livro Os Escravos. No primeiro, temos o continente escravizado a implorar justiça de Deus e no segundo temos o evocar dos sofrimentos dos negros em um navio que transportava escravos da África para o Brasil.
Enquanto poetas de gerações românticas anteriores tomaram o índio como herói, Castro Alves o fez com o negro. Escolha não muito tranquila, já que o negro, ao contrário do índio, era tido como ser sem-alma, não tendo para a sociedade nenhum valor mítico. Devido a isso, o negro, na poesia de Castro Alves, é quase sempre concebido como um mulato com sensibilidades de um branco.
Mas o poeta baiano não foi o primeiro da literatura brasileira a tomar como herói o negro escravizado, porém, tornou-se o poeta por excelência dos escravos, sendo inclusive chamado de “O Poeta dos Escravos”, ao dar ao negro uma atmosfera de dignidade lírica. Ao mostrar a sua bravura e coragem, bem como suas dores e amores, Castro Alves eleva o negro ao mesmo patamar do branco e do índio literário.
Abaixo, transcrevemos trechos do poema “Vozes d’África” e indicamos um vídeo com uma declamação de trechos do poema “O Navio Negreiro” com o ator Paulo Autran e imagens do filme “Amistad”, de Steven Spielberg:

 
VOZES D’ÁFRICA

 Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?

 Em que mundo, em qu'estrela tu t'escondes

 Embuçado nos céus?

 Há dois mil anos te mandei meu grito,

 Que embalde desde então corre o infinito...

 Onde estás, Senhor Deus?...

 [...]
Cristo! embalde morreste sobre um monte

Teu sangue não lavou de minha fronte

A mancha original.

Ainda hoje são, por fado adverso,

Meus filhos - alimária do universo,

Eu - pasto universal...


Hoje em meu sangue a América se nutre

Condor que transformara-se em abutre,

Ave da escravidão,

Ela juntou-se às mais... irmã traidora

Qual de José os vis irmãos outrora

Venderam seu irmão.

 Basta, Senhor! De teu potente braço

Role através dos astros e do espaço

Perdão p'ra os crimes meus!

Há dois mil anos eu soluço um grito...

escuta o brado meu lá no infinito,

Meu Deus! Senhor, meu Deus!!...

 O NAVIO NEGREIRO

A poesia lírica de Castro Alves está representada no livro Espumas Flutuantes. Contudo, este livro não é composto exclusivamente por versos líricos, pois nele ainda figuram algumas composições de caráter épico-social, tais como “O Livro e a América”, “Ode ao Dous de Julho” e “Pedro Ivo”.
 Ao contrário de sua poesia épico-social, a poesia lírica do Poeta dos Escravos exprime-se quase sempre sem ênfase e às vezes com exemplar simplicidade. Na lírica, seu verso se faz sugestivo e as metáforas naturais. A experiência amorosa é relatada de maneira integral, em toda a sua plenitude sentimental e carnal. Em Castro Alves, o amor é desejo, vibração da alma e do corpo, superando, dessa forma, o amor como esquivança e desespero ansioso da geração anterior. Sobre isso, apontou Machado de Assis que a musa de Castro Alves tinha feição própria e que, finalmente, aparecera um poeta original. Abaixo, um trecho do poema “O Adeus de Tereza”:

 

A vez primeira que eu fitei Teresa,

Como as plantas que arrasta

a correnteza,

A valsa nos levou nos giros

seus...

E amamos juntos... E depois

na sala

"Adeus" eu disse-lhe

a tremer co'a fala...

 

E ela, corando, murmurou-me: "adeus."

Uma noite... entreabriu-se um reposteiro...

E da alcova saía um cavaleiro

Inda beijando uma mulher sem véus...

Era eu... Era a pálida Teresa!

"Adeus" lhe disse conservando-a presa...

E ela entre beijos murmurou-me: "adeus!"

Passaram tempos... sec'los de delírio

Prazeres divinais... gozos do Empíreo...

... Mas um dia volvi aos lares meus.

Partindo eu disse — "Voltarei!... descansa!...

Ela, chorando mais que uma criança,

Ela em soluços murmurou-me: "adeus!"

Quando voltei... era o palácio em festa!...

E a voz d'Ela e de um homem lá na orquesta

Preenchiam de amor o azul dos céus.

Entrei!... Ela me olhou branca... surpresa!

Foi a última vez que eu vi Teresa!...

E ela arquejando murmurou-me: "adeus!"

 

Além do tema do amor, também figuraram na poesia lírica de Castro Alves os temas da natureza e da morte. As imagens e metáforas grandiosas do poeta são inspiradas nos aspectos grandiosos da natureza, tais como o oceano, o deserto, o infinito. Também são escolhidas com o mesmo propósito engrandecedor as aves de grande porte e de alto voo, como o condor, a águia, o albatroz. Quando questionado, em entrevista concedida ao escritor e professor Augusto Sérgio Bastos, sobre a poesia na metade do séulo XIX, Castro Alves respondeu:
“A poesia na terra dos Andradas, dos Pedros Ivos, e dos Tiradentes deve ser majestosa como as matas virgens da América; arrojada como seus rios gigantes; livre como os ventos que passam gementes por suas várzeas, e que zurzem os costados pedregosos dos seus gigantes de granito.”
 Castro Alves toma a natureza como metáfora para a expressão de ideais elevados e da volúpia do amor e do desejo, retratando as suas aspirações ao lado das paisagens brasileiras em versos de beleza incomparável.
Também a morte, que perseguiu o poeta desde cedo (aos 16 anos se manifestara no poeta a tuberculose), foi tema recorrente na poesia de Castro Alves. Porém, ao contrário dos poetas que o precederam, o jovem baiano não desejava a morte, não a louvava em seus versos. A morte, em Castro Alves, aparece como amargura limitadora do desejo de viver do poeta. Castro Alves ama a vida e seus prazeres, tem desejo por mudar as estruturas sociais de seu país, quer justiça e igualdade, quer mais vida para cantar esses ideais, para bradar aos céus, ao oceano, o seu canto. Exímio representante dessa temática é o poema “Mocidade e Morte”, um dos mais belos representes da lírica de Castro Alves, que, apesar de ter a morte como tema, não deixa de ser um hino de celebração e amor à vida:

 
Mocidade e Morte

Oh! Eu quero viver, beber perfumes

Na flor silvestre, que embalsama os ares;

Ver minh'alma adejar pelo infinito,

Qual branca vela n'amplidão dos mares.

No seio da mulher há tanto aroma...

Nos seus beijos de fogo há tanta vida...

— Árabe errante, vou dormir à tarde

À sombra fresca da palmeira erguida.

Mas uma voz responde-me sombria:

Terás o sono sob a lájea fria.

Morrer... quando este mundo é um paraíso,

E a alma um cisne de douradas plumas:

Não! o seio da amante é um lago virgem...

Quero boiar à tona das espumas.

Vem! formosa mulher — camélia pálida,

Que banharam de pranto as alvoradas.

[...]

E eu sei que vou morrer... dentro em meu peito

Um mal terrível me devora a vida:

Triste Ahasverus, que no fim da estrada,

Só tem por braços uma cruz erguida.

Sou o cipreste, qu'inda mesmo flórido,

Sombra de morte no ramal encerra!

Vivo - que vaga sobre o chão da morte,

Morto - entre os vivos a vagar na terra.

[...]

E eu morro, ó Deus! na aurora da existência,

Quando a sede e o desejo em nós palpita...

[...]

Sinto que do viver me extingue a lampa...

Resta-me agora por futuro — a terra,

Por glória — nada, por amor — a campa.

Adeus! arrasta-me uma voz sombria

Já me foge a razão na noite fria!..

 

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