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sexta-feira, 13 de julho de 2012

INSETOS GENETICAMENTE MODIFICADOS LUTAM CONTRA DENGUE NA BAHIA


RIO. Juazeiro entrou para o mapa da ciência de vanguarda. Tornou-se o primeiro lugar das Américas a libertar na natureza - de forma controlada, é bom frisar - mosquitos geneticamente modificados para combater a dengue. Um exército de transgênicos alados lançou voo nos testes para controlar a doença. Mal sem vacina ou tratamento que ataca milhares de pessoas no Brasil e no mundo todo ano, o controle das epidemias é feito combatendo seu vetor, o Aedes aegypti. Assim, a princípio a ideia de soltar ainda mais insetos nas áreas afetadas pode parecer estranha. O detalhe, porém, é que não são mosquitos quaisquer. Geneticamente modificados, eles nascem com uma disfunção metabólica e, ao cruzarem com as fêmeas selvagens, transmitem o defeito para a prole, fazendo com que morram ainda na fase de larva. Como consequência, a quantidade de mosquitos cai drasticamente, o que espera-se que seja acompanhado por uma redução no número de novos casos.
Desenvolvidos pela empresa britânica Oxitec, os insetos, da linhagem batizada OX513A, são a arma do Projeto Aedes Transgênico (PAT), que desde o ano passado está sendo testada no bairro de Itaberaba, na periferia de Juazeiro. De lá para cá, o número de mosquitos da espécie na região caiu em mais de 75%. E enquanto a população dos insetos entra em colapso, a de humanos comemora, sem medo de palavras difíceis como transgênicos e da constante presença de técnicos e cientistas.
- Não sei explicar direito o que esse mosquito faz, mas a gente sente que tem menos mosquitos aqui em casa - conta Tamires Carla da Silva Macedo, dona de casa de 24 anos, moradora de Itaberaba. - Não vi mais gente ficando doente aqui perto e antigamente tinha bastante. Que é estranho ver eles ficarem soltando mosquito é, mas eu não me incomodo porque está sendo bom para todo mundo.
Tirando o gene mortal, os mosquitos da Oxitec são idênticos aos encontrados na natureza, explica Margareth Capurro, professora do Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas da USP e responsável pela pesquisa em Juazeiro. A expectativa de vida de ambos, que dependendo das condições ambientais vai de duas semanas a 35 dias, é igual, assim como seu alcance de voo, que normalmente varia entre 50 e 100 metros ao longo de toda vida, e tamanho, de 4 a 7 milímetros. E, pelo que os estudos indicam, nem as fêmeas do Aedes aegypti conseguem diferenciar os potenciais "pais" que lhes darão filhos saudáveis ou que vão morrer ainda na "infância". Como só as fêmeas picam humanos e outros animais para obter de seu sangue os nutrientes necessários para a reprodução, o projeto libera apenas machos na área de estudo.
- Uma das coisas que queríamos ver no teste era como seria o encontro destes mosquitos na natureza - conta Margareth. - Você fazer dentro de um potinho plástico é uma coisa, você está forçando a fêmea a aceitar aquele macho, ela não tem opção. Mas quando você libera na natureza, ela tem opção. Esta foi a grande pergunta por trás deste pequeno projeto neste ano. O mosquito transgênico leva uma vida normal e é por isso que ele funciona.
Os mosquitos modificados estão sendo criados em um laboratório da empresa Moscamed, uma organização social fundada em 2005 em Juazeiro e inicialmente voltada para a produção de insetos empregados no controle das moscas-de-frutas, entre as quais estão espécies que causam os maiores danos à fruticultura global. Desde o início do PAT, mais de 10 milhões de machos transgênicos já foram liberados em Itaberaba. Com o sucesso deste primeiro estudo, no começo deste ano o projeto chegou ao distrito de Mandacaru, também em Juazeiro, onde os resultados iniciais indicam que cerca de 65% das larvas carregam o gene fatal e morrem antes de chegarem à fase adulta.
Mas a verdadeira prova de fogo virá em breve, quando o município de Jacobina deverá ser o primeiro do país a enfrentar uma epidemia de dengue espalhando mosquitos ao invés de caçá-los. O convite, feito pela Secretaria de Saúde do Estado da Bahia, aguarda apenas autorização formal da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Para atender à crescente demanda pelos insetos transgênicos, a Moscamed inaugurou na semana passada uma nova unidade de produção, o que vai elevar sua capacidade de cerca de 500 mil machos modificados por semana para de 4 a 5 milhões semanais, em um investimento de mais de R$ 1,5 milhão em instalações, equipamentos e contratação e treinamento de técnicos.
- Vai ser uma boa oportunidade para demonstrar que a queda na população de mosquitos será acompanhada por uma efetiva redução no número de casos de dengue - aposta o biólogo Danilo Carvalho, funcionário da Oxitec e gerente do PAT, ressaltando, no entanto, que a confirmação disto ainda vai levar tempo, pois devem ser levadas em conta também variáveis epidemiológicas, como a época do ano e os tipos de vírus que estão circulando.



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