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quinta-feira, 29 de março de 2012

MALABARES PARA UM COTIDIANO

Dentre os meus tenho o sotaque
mais estranho.
Meus versos partem em busca
de esconderijos pela casa.
Zanzam noturnos como ratos na cozinha.
Mas falo do palco, do trapézio,
do contorcionismo lexical da poesia.
Eles fazem sim com a cabeça,
simulam sobre os olhos atenção
e engatam com a prosa corriqueira:
o vizinho que pôs o lote à venda,
a ração do gado que deve ser complementar,
a ingenuidade capital que tinha nosso pai.
Fico por aqui, prendo nos olhos
feições secretas do mandacaru.
E da cozinha surge a voz da mesa posta.
Mas nos amamos sob a mesma lona
e construímos ali juntos
nossos trejeitos inocentes.

Marta Eugênia

quinta-feira, 15 de março de 2012

QUEM AGUENTA TUDO ISSO??

"Aprendi com as primaveras a deixar-me podar para voltar melhor."
Cecília Meireles



Dizem que todos os dias você deve comer uma maçã por causa do ferro.
E uma banana pelo potássio.
E também uma laranja pela vitamina C.
Uma xícara de chá verde sem açúcar para prevenir a diabetes.
Todos os dias deve-se tomar ao menos dois litros de água.
E depois uriná-los, o que consome o dobro do tempo.
Todos os dias deve-se tomar um Yakult pelos lactobacilos (que ninguém sabe bem o que é, mas que aos bilhões, ajudam a digestão).
Cada dia uma Aspirina, previne infarto.
Uma taça de vinho tinto também.
Uma de vinho branco estabiliza o sistema nervoso.
Um copo de cerveja, para.... não lembro bem para o que, mas faz bem.
O benefício adicional é que se você tomar tudo isso ao mesmo tempo e tiver um derrame, nem vai perceber... ...
Todos os dias deve-se comer fibra...
Muita, muitíssima fibra.
Fibra suficiente para fazer um pulôver.
Você deve fazer entre quatro e seis refeições leves diariamente.
E nunca se esqueça de mastigar pelo menos cem vezes cada garfada.
Só para comer, serão cerca de cinco horas do dia... UFA !!!
E não se esqueça de escovar os dentes depois de comer...
Ou seja, você tem que escovar os dentes depois da maçã, da banana, da laranja, das seis refeições e enquanto tiver dentes, passar fio dental, massagear a gengiva, escovar a língua e bochechar com Plax.
Há que se dormir oito horas por noite e trabalhar outras oito por dia, mais as cinco comendo são vinte e uma.
Sobram três, desde que você não pegue trânsito. TÁ DIFICILLLLL
As estatísticas comprovam que assistimos três horas de TV por dia.
Menos você, porque todos os dias você vai caminhar ao menos meia hora (por experiência própria, após quinze minutos dê meia volta e comece a voltar, ou a meia hora vira uma).
E você deve cuidar das amizades, porque são como uma planta: devem ser regadas diariamente, o que me faz pensar em quem vai cuidar das minhas amizades quando eu estiver viajando.
Deve-se estar bem informado também, lendo dois ou três jornais por dia para comparar as informações.

Ah! E o sexo!!!!
Todos os dias, um dia sim, o outro também, tomando o cuidado de não se cair na rotina.
Há que ser criativo, inovador para renovar a sedução.
Dizer EU TE AMO, toda hora, ''ainda pego quem inventou essa neura...!!!' '
Também precisa sobrar tempo para varrer, passar, lavar roupa, pratos e espero que você não tenha um bichinho de estimação. se tiver tem que brincar com ele, pelo menos meia hora todo dia, para ele não ficar deprimido... .

Na minha conta são 29 horas por dia...

A única solução que me ocorre é fazer várias dessas coisas ao mesmo tempo!!!

Tomar banho frio com a boca aberta, assim você toma água e escova os dentes ao mesmo tempo.
Chame os amigos e seus pais, seu amor, o sogro, a sogra, os cunhados...
Beba o vinho, coma a maçã e dê a banana na boca da sua mulher. Não esqueça do EU TE AMO, (Vou achar logo quem inventou isso, me aguarde).
Ainda bem que somos crescidinhos, senão ainda teria um Danoninho e se sobrarem 5 minutos, uma colherada de leite de magnésia.
Agora você tá ferrado mesmo é se tiver criança pequena, ai lascou de vez, porque o tempo que ia sobrar para você...meu já era. Criança ocupa um tempo danado...
Agora tenho que ir.
É o meio do dia, e depois da cerveja, do vinho e da maçã, tenho que ir ao banheiro e correndo.
E já que vou, levo um jornal...
Tchau...
Se sobrar um tempinho, me manda um e-mail.


Luís Fernando Veríssimo

domingo, 4 de março de 2012

AS FUNÇÕES DA LINGUAGEM

Por Mário Eduardo Martelotta

Quando nos deparamos com a expressão "funções da linguagem", devemos inicialmente nos perguntar em que sentido o vocábulo "função" está sendo empregado. Trata-se de um termo de difícil definição, já que, além de ser utilizado com acepções distintas por autores diferentes, não é raro um mesmo autor lhe atribuir significados um pouco distintos.
Entretanto, deixando de lado questões teóricas mais complexas, podemos atingir uma boa compreensão de termo, apelando para o conceito de função que empregamos no nosso dia a dia. Se alguém nos perguntasse qual a função do apagador na sala de aula, não teríamos dificuldade em responder que, como o próprio nome sugere, tal objeto serve para apagar o quadro. Do mesmo modo, não teríamos problemas em enumerar funções de ferramentas como martelo ou a chave de fenda.
Mas, quando se trata de algo abstrato e complexo como a linguagem, a pergunta se torna mais difícil de responder: qual a função – ou as funções – da linguagem? Poderíamos propor que a função da linguagem é transmitir informações de um indivíduo a outro ou de uma geração a outra. Mas essa visão se mostra, no mínimo, ingênua quando presenciamos o seguinte diálogo entre duas pessoas que se encontram na rua: um deles pergunta “Como vai? Tudo bem?”, o outro responde com a mesma pergunta “Como vai? Tudo bem?” e ambos continuam seu caminho com a consciência de ter cumprido plenamente seu papel social. Não podemos dizer que, em casos como esse, tenha ocorrido, de fato, transmissão de informação.
Se a linguagem possui diferentes funções, associadas a comportamentos enraizados na vida social que transcendem a mera transmissão de informações, como delimitar essas funções? Vários cientistas tentaram responder a essa pergunta, como o psicólogo alemão Karl Bühler e linguistas como Roman Jakobson e, mais recentemente, M. A. K. Halliday. Passaremos a analisar a proposta de Jakobson.

AS FUNÇÕES DA LINGUAGEM SEGUNDO JAKOBSON

Segundo o autor, a linguagem apresenta uma variedade de funções, mas, para que possamos compreender cada uma delas, devemos levar em conta os elementos constitutivos de todo ato de comunicação, que estão abaixo arranjados:

 Esquema de Jakobson
Devemos entender desse quadro que, para que haja comunicação, não basta que um remetente envie uma mensagem a um destinatário, pois, para que essa mensagem seja compreendida, é necessário que ela preencha algumas condições. Isso significa que uma mensagem eficaz requer:

a)     Um contexto apreensível pelo destinatário
Estamos aqui diante de outro termo de difícil definição. A noção de “contexto” remete ao próprio conteúdo referencial da mensagem, ou seja, às informações que fazem referência à realidade biossocial que circunda nossa vida e que estão em evidência na mensagem transmitida. Nesse sentido, podemos dizer que as informações, na prática, nunca se limitam ao conteúdo da mensagem em si. Ou seja, a interpretação adequada de uma frase pode, por exemplo, depender de informações transmitidas em frases proferidas anteriormente (contexto linguístico) ou de dados referente ao local, ao momento da comunicação ou mesmo ao tipo de relação entre os interlocutores (situação extralinguística).
Quando ouvimos, por exemplo, alguém proferir uma frase como “Passei muitos exercícios na aula de hoje”, acionamos um conjunto de conhecimentos referentes à estrutura de uma sela de aula, que são necessários para que possamos compreender plenamente o conteúdo dessa frase. Sabemos de antemão que aulas são eventos diários, o que nos permite compreender, sem problemas, a expressão “aula de hoje”. Temos conhecimento, através de nossa vivência escolar, de que exercícios de fixação fazem parte do procedimento, assim como eles são normalmente ministrados. Essas informações, embora não sejam expressas na frase, são evocadas pelo destinatário no processo de decodificação e sem elas não seria possível uma interpretação adequada.
Ampliando um pouco mais a noção de contexto, podemos dizer que o termo abrange todas as informações referentes às condições de produção da mensagem: o emissor, o destinatário, o tipo de relação existente entre eles, o local e a situação em que a mensagem é proferida, entre outras coisas. Nesse sentido, se a frase acima fosse enunciada por um professor de português, por exemplo, assumiria um sentido diferente daquela que apresentaria se tivesse sido dita por um professor de ginástica, já que, no segundo caso os exercícios seriam de natureza física.
Resumindo, para que o destinatário possa compreender a mensagem, precisa conhecer um conjunto de informações que vai desde elementos relacionados ao momento da produção dessa mensagem ate dados referentes ao conhecimento do assunto em pauta. A esse conjunto de conhecimentos podemos chamar de contexto.

b) Um código que seja conhecido por remetente e destinatário

O termo “código” constitui um conjunto de sinais ou signos convencionados para promover a comunicação entre as pessoas. São códigos as línguas faladas no mundo como o português ou o italiano, assim como os suas correspondentes escritas. São também códigos da língua de sinais utilizada pelos surdos, os painéis de sinalização de trânsito, o código Morse, entre outros.
Não é difícil compreender que, para que se dê a comunicação, remetente e destinatário têm de utilizar e conhecer razoavelmente o mesmo código. Um japonês que não fale português e um brasileiro que não conheça japonês certamente terão muitas dificuldades de se comunicar; a solução para seu problema seria buscar outro código para se comunicarem entre si: gestos, outra língua mais conhecida como o inglês, etc.

c) Um contato ou contato ou canal físico e uma conexão psicológica entre remetente e destinatário que permita a troca de informações

“O termo canal” refere-se ao meio pelo qual é transmitida a mensagem. No caso da comunicação verbal em presença, considera-se que o ar, através do qual as ondas sonoras se propagam, é o canal transmissor. No caso de comunicação a distância, o telefone é um canal de comunicação, assim como as faixas de frequência de radio, por exemplo. Podemos compreender, entre, que um remetente localizado no Ceará terá dificuldades de se comunicar com alguém que esteja no Rio Grande do sul, a menos que consiga utilizar algum canal de comunicação. Nesse caso, telefone ou e-mail são algumas das alternativas possíveis.
Por outro lado, como uma frase nunca traz todas as informações necessárias para a compreensão adequada da mensagem, como dissemos ao analisar a noção de contexto, a comunicação é essencialmente uma atividade cooperativa. É fundamental, portanto, algum tipo de interesse comum que crie uma conexão psicológica entre os participantes, sem a qual a comunicação seria prejudicada.
Com base nesses elementos constitutivos do ato da comunicação, Jakobson estipulou seis funções da linguagem, cada uma centrada em um desses elementos. Vejamos:

1)    Função referencial consiste na transmissão de informações do remetente ao destinatário. Essa função está centrada no contexto já que reflete uma preocupação em transmitir conhecimentos referentes a pessoas, objetos ou acontecimentos. Podemos pensar como exemplos dessa função as notícias apresentadas em um veículo de informações como o jornal.
2)    Função emotiva consiste na exteriorização da emoção do remetente em relação àquilo que fala de modo que essa emoção transpareça no nível da mensagem. Essa função está centrada no próprio remetente, já que é sua emoção que está em jogo na mensagem. Um exemplo de função emotiva está em uma situação em que o indivíduo, ao tentar martelar um prego, acerta o próprio dedo e profere um palavrão. Em mensagens marcadas por esta função, podemos detectar a emoção do remetente na entonação que usa (é edifícil imaginar um locutor narrando uma partida de futebol com uma entonação sonolenta já que sua tarefa é passar emoção do jogo) ou em sua escolha vocabular (entre as frases “Ele saiu de casa” e “O canalha abandonou o lar”, a segunda é certamente mais emotiva já que reflete um envolvimento do falante com a situação).
3)    Função conativaconsiste em influenciar o comportamento do destinatário. Essa função está centrada no destinatário, já que ele é o alvo da informação. Um bom exemplo da função conativa é a propaganda, cuja função básica é persuadir o público a comprar um produto, votar em um político ou agir de determinada maneira.
4)    Função fática consiste em iniciar, prolongar ou terminar um ato de comunicação. Está, portanto, centrada no canal, já que não visa propriamente à comunicação, mas ao estabelecimento ou ao fim do contato, refletindo também a preocupação de testar o contato, checar o recebimento da mensagem e, em muitos casos, tentar manter o contato. Um exemplo disso podemos ver na utilização do alô, no telefone, para indicar que estamos na escuta, prontos para que o interlocutor tem a dizer.
5)    Função metalinguística consiste em usar a linguagem para se referir à própria linguagem. Centrada no código, essa função se justifica pelo fato de os humanos utilizarem a linguagem para se referir não apenas à realidade biossocial, mas também aos aspectos relacionados ao código ou à linguagem utilizados para esse fim. Os verbetes de dicionário são um bom exemplo desse tipo de função, já que dão pistas do significado das palavras.
6)    Função poética consiste na projeção do eixo da seleção sobre o eixo da combinação dos elementos linguísticos. Centrada na mensagem, essa função caracteriza-se pelo enfoque na mensagem e em sua forma.
Para que possamos compreender essa definição, temos de nos lembrar daquilo que Jakobson caracterizou como os dois tipos básicos de arranjos utilizados no processo verbal: seleção e combinação. Nesse sentido, podemos dizer que, ao formar uma frase, inicialmente o falante seleciona as palavras que melhor expressam suas ideias naquela situação de comunicação. Além disso, o falante combina, de acordo com as regras sintáticas de sua língua, as palavras selecionadas, de modo que elas constituam um enunciado que faça sentido para o interlocutor.
Mas voltemos à definição proposta por Jakobson para função poética. Como compreender a noção de projeção do eixo da combinação sobre o eixo de seleção? Para isso precisamos entender que a combinação das palavras se manifesta na superfície da frase, sendo, portanto, perceptível para o ouvinte. Por outro lado, a seleção constitui um processo de cunho psicológico, que normalmente não é visível na estrutura da frase. Como o ouvinte poderia perceber que o falante escolheu os termos da frase que acabou de transmitir? Seguindo Jakobson, isso ocorre em mensagens caracterizadas por rimas, jogos de palavras, aliterações e outros processos da natureza estilística, que sugerem uma escolha mais cuidadosa das palavras. Vejamos os versos de Chico Buarque apresentados abaixo:

A gente faz hora, faz fila na vila do meio-dia
Para ver Maria
A gente almoça e só se coça, e se roça, e só se vicia.

Podemos notar, nos versos acima, repetições de sons e rima. A presença desses recursos demonstra que essas palavras foram escolhidas de modo meticuloso para, nesse caso especificarmos, criar o efeito estético que caracteriza o discurso poético. Ou seja, em função desses recursos, o eixo da combinação se projeta sobre o da seleção, ficando também evidente na superfície da frase. Esse é um bom exemplo de função poética.
É importante registrar aqui que a função poética não está presente apenas em textos literários. Segundo Jakobson, a função poética não é exclusiva da arte verbal, mas predominante nela. Isso significa que podemos encontrá-la também em ditados e expressões populares (ex.: “água mole em pedra dura tanto bate até que fura” e “por fora bela viola, por dentro pão bolorento”) ou em slogans de propaganda (ex.: “Quem é vivo faz seguro de vida no fundo Itaú”, em que a palavra “vivo” recebe, ao mesmo tempo, duas interpretações: “que está vivo” e “esperto”).
Aliás, Jakobson chama atenção para o fato de que, embora, para efeito de análise, possamos distinguir essas seis funções, na prática, elas não são exclusivas. Ou seja, uma mesma mensagem apresenta mais de uma dessas funções, de modo que a decisão referente a qual a função que caracteriza uma mensagem é mais uma questão de decidir a ordem hierárquica de funções do que de escolher apenas uma.

MARTELOTTA, Mário Eduardo. (Org.) Manual de Linguística. 1. ed. 2ª reimpressão - São Paulo: Contexto, 2009.

DAS NUANCES DA LITERATURA E SUAS MALDIÇÕES

por Alessandro Garcia

Edgar Allan Poe estabelece que a gênese do bom conto deve partir de um efeito único a ser atingido e assim ir acomodando os acontecimentos de forma a satisfazê-lo, insistindo na regularidade e eficiência que deverão manter a atenção do leitor e de um único eixo dramático, não permitindo intervenções, comentários e descrições quando desnecessários. Ele visa a um objetivo único, imutável, caminha em direção a uma luz sem propósitos de alterações que possam vir a confundir o leitor a respeito da proposta inicial do autor. Poe estabelece uma situação inicial e a partir dela trabalha de forma concentrada situações capazes de criar o suspense no leitor conduzindo-o até o clímax. Para Poe, isto é o necessário para o escritor do conto atingir seus objetivos.
Já Julio Cortázar, no ensaio Alguns aspectos do conto [publicado no livro "Valise de Cronópio"], nos diz que os contos de Tchekov visam apresentar algo que está além do conto em si, tanto antes como depois. Muito além do fato narrado, escondem-se outros fatores que devem ser destrinchados pelo leitor. Utilizando como exemplo o conto “O bilhete de loteria”, onde a tensão está concentrada em Ivan Dmitritchi e sua esposa que imaginam terem ganho o prêmio da loteria. Durante o conto a ação é praticamente nula, apenas com os dois se observando e imaginando o que fazer com o dinheiro, porém quando certificam-se de que não ganharam nada, voltam-se para a realidade. Não há nada além disso se pensarmos de acordo com a teoria de Poe, mas de acordo com o pensamento de Cortázar sobre a obra de Tchekov as coisas se passariam de modo diferente. O que seria, então, esta outra intenção?
Existem subterfúgios diversos, possibilidades mil de se esconder as diversas nuances existentes em um conto. Ou de contá-las da maneira mais fascinante possível, deixando ao leitor o intrincado jogo de revelação sobre o que de fato ele representa. Em uma palestra para escritores cubanos da Revolução, Cortázar discorreu sobre sua maneira de olhar para o conto. Para ele, a função de um conto é quebrar seus próprios limites para ir muito além da pequena história que narra. E neste quesito, a escolha do tema se torna imprescindível como ato de criação. Cortázar defende que o tema deve ser uma condição primordial para o contista esmiuçar sua história de maneira aglutinante e mais vasta que um mero argumento. E para isto, é necessário uma total dedicação e motivação com o assunto a ser retratado, caso contrário, o conto já nasce completamente comprometido. Dedicação, conhecimento – o esmiuçar do tema escolhido, procurando retirar do conto, desde a sua proposta de escrita, todos os diferentes ângulos de análise possível ou apresentar um, deixando para o leitor as possibilidades interpretativas de todos os outros existentes.
E isto vai além de toda a verborragia que perpassa uma produção literária que hoje tem insistido mais nas digressões e no vomitar vazio de palavras, do que no esmiuçar destas diversas possibilidades que Cortázar nos apresenta. A atual safra de contos que tem se apresentado, principalmente através das revistas eletrônicas tão vastas na net, têm apresentado, quase sem novas ousadias, o apego as características dos escritores “malditos”. Não à toa, as suas referência esbarram quase que inevitavelmente em John Fante, Charles Bukowski, Jack Kerouac, Alan Ginsberg, entre outros. Sobre o primeiro, acho peculiar que também sempre esteja inserido no rol da “maldição”. Sua obra prima, Pergunte ao Pó, tão aclamada por Charles Bukowski, apesar de contar com fluxos de memória freqüentes, narração em primeira pessoa e com uma temática comum nestas obras — a busca de sentido pelo personagem título que vaga insone, com pouco dinheiro e intercalando diversas aventuras mundanas pelas noites de alguma grande cidade — a meu ver não pode ser simplesmente comparada com obras como a de seu próprio “discípulo” Bukowski e suas insanas e toscas aventuras repletas de gratuita imersão na quase pornografia e constante embriaguez de seus personagens alter-egos.
Alguns jornalistas e críticos, interessados em fazer um mapa atualizado sobre quem são os escritores da dita nova geração que têm se prestado a perpetuar tal espécime de “categoria literária”, se assim se pode chamar, têm, no entanto, ensacado todos os escritores estreantes como cópias mal disfarçadas uns dos outros.
É notória, no entanto, a constatação de um tipo de literatura atual que, se não totalmente fundamentada nos alicerces da geração dos malditos, têm apresentado elementos que os equiparem em algum ponto a esta literatura evidentemente provocativa de então. Lógico que a literatura como provocação é uma atitude louvável quando não calcada em experimentações já desgastadas e em formas fáceis. O apelo para o estranhamento, como se buscou outrora, deve buscar ao menos o novo para se fazer original e não caricatura de um estilo que, mais do que discriminado como foi na sua primeira geração, hoje tem se convertido em status, grife identificadora. Desta maneira, quem não quer ser maldito?

EM NOME POEMA DE JORGE BARBOSA FILHO

do pai
do fumo                                 da filha                                da grana
do álcool                 dos espíritos do mundo             da fama
das drogas do mundo      o êxtase      das modas do mundo
a vagina                     da cama                         o falo
do coma
dos sonhos do mundo
a foda
da trama
do palco
das máscaras do mundo
a merda
da forma
do fundo
das estruturas do mundo
a mola
da bala
da vala
dos mortos do mundo
o mudo
da muda
do mundo
das flores do imundo
amém…

sábado, 3 de março de 2012

Ó PÁTRIA AMADA IDOLATRADA, SALVE, SALVE!

Cordelista critica BBB e Pedro Bial em versos

Com um humor peculiar, o educador e cordelista baiano Antonio Carlos de Oliveira Barreto compôs 25 septilhas – estrofes de sete versos-- sobre o programa "Big Brother Brasil", exibido diariamente pela TV Globo. O cordel "Big Brother Brasil: um Programa Imbecil" tece críticas tanto ao BBB quanto ao apresentador Pedro Bial. Barreto diz não ter nada contra o programa, mas fica indignado com a omissão dos educadores que apenas criticam e não oferecem uma alternativa à atração. Barreto escreve sobre temas do cotidiano. Natural de Santa Bárbara (BA), o autor publicou seu primeiro cordel ("O Discurso de um Caipira") em 2004 por incentivo de seus amigos também cordelistas – Jotacê Freitas e Antônio Vieira.
O educador utiliza o cordel como um instrumento pedagógico, tanto em aulas quanto em oficinas que ministra. Ele pretende estabelecer um diálogo entre os educadores e os alunos. Leia abaixo o cordel "Big Brother Brasil: um Programa Imbecil".





CURTIR O PEDRO BIAL

E sentir tanta alegria
É sinal de que você
O mau-gosto aprecia
Dá valor ao que é banal
É preguiçoso mental
E adora baixaria.



 
Há muito tempo não vejo
Um programa tão 'fuleiro'
Produzido pela Globo
Visando Ibope e dinheiro
Que além de alienar
Vai por certo atrofiar
A mente do brasileiro.


Me refiro ao brasileiro
Que está em formação
E precisa evoluir
Através da Educação
Mas se torna um refém
Iletrado, 'zé-ninguém'
Um escravo da ilusão.


Em frente à televisão
Lá está toda a família
Longe da realidade
Onde a bobagem fervilha
Não sabendo essa gente
Desprovida e inocente
Desta enorme 'armadilha'.


Cuidado, Pedro Bial
Chega de esculhambação
Respeite o trabalhador
Dessa sofrida Nação
Deixe de chamar de heróis
Essas girls e esses boys
Que têm cara de bundão.


O seu pai e a sua mãe,
Querido Pedro Bial,
São verdadeiros heróis
E merecem nosso aval
Pois tiveram que lutar
Pra manter e te educar
Com esforço especial.


Muitos já se sentem mal
Com seu discurso vazio.
Pessoas inteligentes
Se enchem de calafrio
Porque quando você fala
A sua palavra é bala
A ferir o nosso brio.


Um país como Brasil
Carente de educação
Precisa de gente grande
Para dar boa lição
Mas você na rede Globo
Faz esse papel de bobo
Enganando a Nação.


Respeite, Pedro Bial
Nosso povo brasileiro
Que acorda de madrugada
E trabalha o dia inteiro
Dar muito duro, anda rouco
Paga impostos, ganha pouco:
Povo HERÓI, povo guerreiro.


Enquanto a sociedade
Neste momento atual
Se preocupa com a crise
Econômica e social
Você precisa entender
Que queremos aprender
Algo sério - não banal.


Esse programa da Globo
Vem nos mostrar sem engano
Que tudo que ali ocorre
Parece um zoológico humano
Onde impera a esperteza
A malandragem, a baixeza:
Um cenário sub-humano.

A moral e a inteligência
Não são mais valorizadas.
Os "heróis" protagonizam
Um mundo de palhaçadas
Sem critério e sem ética
Em que vaidade e estética
São muito mais que louvadas.


Não se vê força poética
Nem projeto educativo.
Um mar de vulgaridade
Já tornou-se imperativo.
O que se vê realmente
É um programa deprimente
Sem nenhum objetivo.


Talvez haja objetivo
"professor", Pedro Bial
O que vocês tão querendo
É injetar o banal
Deseducando o Brasil
Nesse Big Brother vil
De lavagem cerebral.

Isso é um desserviço
Mal exemplo à juventude
Que precisa de esperança
Educação e atitude
Porém a mediocridade
Unida à banalidade
Faz com que ninguém estude.


É grande o constrangimento
De pessoas confinadas
Num espaço luxuoso
Curtindo todas baladas:
Corpos "belos" na piscina
A gastar adrenalina:
Nesse mar de palhaçadas.


Se a intenção da Globo
É de nos "emburrecer"
Deixando o povo demente
Refém do seu poder:
Pois saiba que a exceção
(Amantes da educação)
Vai contestar a valer.


A você, Pedro Bial
Um mercador da ilusão
Junto a poderosa Globo
Que conduz nossa Nação
Eu lhe peço esse favor:
Reflita no seu labor
E escute seu coração.

E vocês caros irmãos
Que estão nessa cegueira
Não façam mais ligações
Apoiando essa besteira.
Não deem sua grana à Globo
Isso é papel de bobo:
Fujam dessa baboseira.


E quando chegar ao fim
Desse Big Brother vil
Que em nada contribui
Para o povo varonil
Ninguém vai sentir saudade:
Quem lucra é a sociedade
Do nosso querido Brasil.


E saiba, caro leitor
Que nós somos os culpados
Porque sai do nosso bolso
Esses milhões desejados
Que são ligações diárias
Bastante desnecessárias
Pra esses desocupados.


A loja do BBB
Vendendo só porcaria
Enganando muita gente
Que logo se contagia
Com tanta futilidade
Um mar de vulgaridade
Que nunca terá valia.


Chega de vulgaridade
E apelo sexual.
Não somos só futebol,
baixaria e carnaval.
Queremos Educação
E também evolução
No mundo espiritual.


Cadê a cidadania
Dos nossos educadores
Dos alunos, dos políticos
Poetas, trabalhadores?
Seremos sempre enganados
e vamos ficar calados
diante de enganadores?


Barreto termina assim
Alertando ao Bial:
Reveja logo esse equívoco
Reaja à força do mal
Eleve o seu coraçãoTomando uma decisão
Ou então: siga, animal.

Fonte: http://www.introspeccaoestudantil.blogspot.com/  Acessado em: 03/03/12