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quinta-feira, 7 de julho de 2011

BIOPSIA

Enrodilhava as palavras com babados, lantejoulas,
bicos em renda e bordados, contando histórias pra gente.
Era a mágica que usava pra colar festas nas horas.
Minha mãe era um rastro profundo.
Uma distância pedrava nela, à espreita de algum vão.
“Mais tarde eu conto outra”, dizia.
E demorava as léguas todas por dias. . .
Meus anseios aprenderam a tardear-se desde cedo
por herança materna.
E disso gozo de ares obsoletos, penduro as chaves num cordão,
penso e escrevo à mão.
Idosos, rezas, retalhos, termos arcaicos do baú de meus avós:
camarinha, botija, algibeira, caritó me tomam por comoção.
Há vigilância em meus olhos e a passos lentos.
Pois que vem do pôr-do-sol a palavra tardia.
Minha mãe gastava o sim sem nem um pingo de freio.
Mas quando o brinquedo chegava pra me existir,
o mundo mudara de assunto.
Passei desde então a cavar pelos dias
e puxar entre buracos de paredes
meus ditames entardecidos.
Marta Eugênia

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