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terça-feira, 8 de março de 2011

A PALAVRA NO MUNDO DA IMAGEM: A COERÊNCIA NOS TEXTOS PUBLICITÁRIOS.

Aldemir Francelino da Silva 1 
Carlos Wagner de Lira 2 
Edneide Maria de Lima 3 

Resumo:

Neste trabalho, investigamos os efeitos de sentido de um texto publicitário (in) coerente veiculado em algumas propagandas expostas na cidade de Arapiraca. Para atingir o objetivo proposto, analisamos os vários recursos argumentativos utilizados na mensagem publicitária, visando conhecer melhor suas “armas”, principalmente, quando “desmontamos” os jogos de linguagem presentes na propaganda analisada. Para Koch e Travaglia (1999:31), a continuidade de sentido em textos publicitários pode depender de outros fatores sócio-culturais como ideologias, mitos antigos e modernos, normas de comportamento (interpretadas como advertências, insultos, agressões aos direitos humanos, etc), e outros. Com as ferramentas que dispõe, a propaganda é responsável em provocar, no leitor, uma reação favorável à idéia apresentada.

Palavras-chave: propaganda publicitária; texto; jogos de linguagem; coerência textual.

1. Palavras introdutórias...

Como se forma o sentido de um texto publicitário? De que recursos dispõe quem escreve para conferir ao texto os sentidos que quer expressar? E quem lê, a que elementos deve prestar atenção para “descobrir” os sentidos do texto? Ou seja, que elementos e que recursos são mobilizados no processamento de textos, tanto na recepção quanto na produção? Afinal, escrever um texto publicitário implica deixar nele as marcas necessárias para que seja “lido” de acordo com os sentidos que lhe quis dar quem o escreveu. E ler um texto do gênero propaganda implica percorrer o caminho inverso: decifrar as marcas e sinais deixados pelo autor para decifrar-lhe o sentido, ou os sentidos. Enfim, que recursos, marcas, sinais, elementos compõem os textos publicitários?
Sabe-se que o sentido de um texto não se forma exclusivamente pela decifração das marcas e sinais deixados nele pelo autor, já que o leitor não é um decifrador passivo de signos. O leitor é um construtor de sentido (KOCH, 2006, p. 13). Interferem, nessa formação de sentido, o conhecimento de mundo do leitor, suas crenças, seu passado, suas leituras anteriores, além do contexto e de muitos outros fatores. E recorremos ainda a vários tipos de conhecimento: lingüístico, enciclopédico, interacional, comunicacional, etc. Percebe-se, então, que tanto a produção quanto a recepção de textos são atividades complexas.

2. O que é texto

O que é um texto? Texto não é um amontoado desorganizado de palavras. O fato de se escreverem palavras existentes na língua, em uma seqüência, não significa que se construiu um texto.
Veja os seguintes textos:

(1) O gato comeu o peixe que meu pai pescou. O peixe era grande. Meu pai é alto. Eu gosto de meu pai. Minha mãe também gosta. O gato é branco. Tenho muitas roupas brancas.

(2) No rádio toca um samba. O samba é um ritmo antigo. O coração também tem ritmo. Ele é um músculo oco composto de duas aurículas e dois ventrículos.

(3) “O Brasil tem muitos problemas sociais, econômicos e culturais. O presidente FHC viajou para a Europa porque o meu vizinho matou o meu cachorro. Mas grande parte da pobreza nacional é conseqüência da violência social, porque a vida sexual das pessoas deve ser responsável e a AIDS é um problema mundial e ninguém entendeu os motivos da viagem do presidente. Use preservativo sempre, presidente, porque foi viajar?”

Nos exemplos (1) e (2), verifica-se algo semelhante: a incoerência é causada por um deslocamento de sentido que acontece a cada nova sentença. Apesar de haver certa coesão entre orações, ela não ocorre no parágrafo como um todo.
Observe que o no exemplo (3), as palavras utilizadas no texto existe em português, as orações até que apresentam uma construção sintática direta (sujeito, verbo e complementos) possível. O sujeito concorda com os verbos, os nomes (substantivo, adjetivos, advérbios, etc.) concordam em número (singular/plural) e gênero (masculino /feminino), ou seja, as palavras têm muitas condições gramaticais para serem consideradas um texto, mas não formam um texto.
De imediato, vem a seguinte indagação: por que esse conjunto de palavras que forma um todo, aparentemente, significativo, no propósito de transmitir informações sobre determinado assunto não é considerado um texto? Koch e Travaglia vêm tentar responder a pergunta que ficou de início, sem resposta. Segundo eles, isso acontece devido esse amontoado de palavras não fornecer subsídios eficazes que contribuem, de maneira geral, para dá sentido ao texto, e com isso não torna possível o entendimento por parte do leitor, ocasionado pela falta de conhecimento de mundo, isto é, conhecimentos prévios que leve a ser reconhecível e reconhecida pelo mesmo. É um texto incoerente, ou seja, sem conexão lógica entre as idéias apresentadas no texto. Não há relação de sentido no seguinte trecho: “o presidente FHC viajou ‘ e” meu vizinho matou meu cachorro ‘ por exemplo. Além disso, observa-se que essas idéias não possuem nexos, pois se fizer uma análise da palavra ‘ porque ‘ no texto, verifica-se que se trata de uma conjunção causal e que a morte do meu cachorro não é motivo da causa da viagem do presidente, havendo, desta forma, uma inadequação causada pela falta de coesão, que tem por objetivo através de conectivos gramaticais fazer ligações entre as idéias.
Desta forma, para que se possa escrever um bom texto, é necessário que o criador do texto conheça essas funções chamadas de elementos lingüísticos, responsáveis pela coesão, e percebe as relações lógicas ou a coerência textual.
O escritor escreve um texto na intenção de alguma coisa e no objetivo do leitor captar sua intenção, seja para informar, convencer, emocionar, esclarecer o seu próprio texto, seja para criar efeitos artísticos por meio da seleção e combinação das palavras, levando em consideração além de suas sonoridades, as múltiplas relações de sentido, que de certa forma, impressionam o leitor.
O leitor ao visualizar o texto, antes mesmo de começar a ler, pode utilizar elementos materiais que dão pistas da intenção que aquele texto quer passar, criando expectativas e formulando hipóteses, que serão confirmadas ou não no decorrer da leitura.
Se um texto, por exemplo, for um artigo de jornal ou revista, pode-se de imediato identificar que trata-se de um texto informativo, seja na área econômica, social, política, artística, religiosa ou científica. Caso trate de uma ficção, a intenção expressa poderá ser artística, emotiva.
Pode-se perceber que cada autor possui características próprias, e caso o leitor conheça esse autor, antes mesmo de ler seu texto, terá uma noção do que vai ler ou até mesmo se ler apenas o título já terá uma noção inicial de que assunto se trata.
Todos os textos nascem do conhecimento de mundo que o autor tem durante uma experiência de vida e como ele escreve na intenção de alguém ler, é necessário a interação entre autor/leitor, ou seja, o leitor deve da mesma maneira que o autor utiliza seu conhecimento de mundo, conhecimentos prévios que ajudará a interpretar a mensagem passada. Acontece que, muitas vezes, não se consegue entender um texto devido o leitor não ter nunca lido um acontecimento de mundo sobre o qual o texto trata, ou não viveu o conhecimento de mundo que o escritor deseja transmitir.
Segundo Koch e Travaglia,
“... Coerência é algo que se estabelece na interlocução, na interação entre dois usuários (da Língua) numa dada situação (. Possivelmente em função disso, Charolles – 1979; 81 afirmou que a coerência lógica textual) seria a qualidade que têm os textos pela qual os falantes reconhecem como bem formados, dentro do mundo possível...” (1995, p. 31 ).
Ou seja, a boa formação de um texto ocorre quando os falantes têm a possibilidade de recuperarem o sentido de um texto. Este princípio se dá através da coerência como princípio de interpretabilidade, e que depende da capacidade de cada indivíduo em compreender o texto através de sua interação com o mesmo. Para isso, o leitor utiliza estratégias durante o ato de ler, como por exemplo, a inferência, que possibilita tirar conclusões de uma ou mais proposições já conhecidas pelo receptor, e que será verídico se essas conclusões estiverem contidas explicitamente ou implicitamente nas premissas, possibilitando por completo no entendimento do enunciado.
Enfim, um texto seja oral ou escrito deve ser formado por:
- Uma unidade de linguagem em uso: nela estão expressas as intenções do produtor, o contexto social em que se estabelece a comunicação, o jogo de imagens, de postura e o tipo de informação a ser veiculada, ou seja, o autor nesse caso utiliza para argumentar seu texto o seu conhecimento de mundo;
- Uma unidade semântica (de significado): o texto deve ser minuciosamente trabalhado pelo enunciador, no propósito de atingir seu objetivo específico, que é o entendido por completo da mensagem a ser transmitida para o seu receptor;
- Uma unidade formal: os elementos lingüísticos do qual fazem parte do texto deve estar ligados uns com os outros para propiciar a idéia a ser transmitida, isso graças à coesão.
Essas três características citadas acima é o que se chama de textualidade, segundo as quais garante que o texto seja um texto e não um simples amontoado de frases sem relação entre elas.

ELEMENTOS DA TEXTUALIDADE

3. Coerência

Responsável pelo sentido do texto envolve fatores lógico-semânticos e cognitivos, já que a interpretabilidade do texto depende do conhecimento partilhado entre os interlocutores. Um texto é coerente quando compatível com o conhecimento de mundo do receptor. Observar a coerência é importante, pois permite perceber que um texto não existe em si mesmo, mas se constrói na relação emissor- receptor- mundo.
O texto em questão utiliza-se do fato de que as propagandas estão sempre em evidência na sociedade, principalmente as de cerveja, que até travam brigas e rixas públicas. Através disso, criam todo um contexto para discutir as mensagens finais que cada uma veicula. Desse modo, o autor tece uma crítica a todo esse sistema comunicativo, no qual é permitido utilizar de qualquer mecanismo para persuadir o telespectador à compra, mesmo que seja de produtos supérfluos ou que causem mal a saúde, desde que, ao final, apresentem uma frase de advertência para que, de certa forma, amenizem o estrago, com a evidência da palavra “moderação”.
O autor tece diversas análises sobre as propagandas comerciais e até critica o cenário político do Brasil, bem como, o consumismo. Alguns exemplos:

“Endivide-se com moderação”
”Desenvolva um enfisema pulmonar com moderação”
“Vicie-se com moderação”
“Encha sua cara de espinhas com moderação”
“Inveje com moderação”
“Acredite com moderação”
“Desconfie com moderação”

O texto segue o mesmo raciocínio, em todos os parágrafos, e a estrutura de sua tipologia textual, no caso, um texto informativo que usa da ironia para convencer o leitor das idéias colocadas. Para criar uma relação com o leitor, o texto sugere novos slogans de propaganda, que segundo ele, seriam mais úteis para a sociedade e poderiam resolver os problemas das relações humanas, nas quais, muitas vezes, esse leitor pode estar inserido. Alguns exemplos são:

“Não fure fila, o mal educado...”
“Jogue a embalagem no lixo, seu porco...”
“Sinal vermelho foi feito para parar, sabia...”

Todo o trabalho de escolha lexical visa à coerência do texto, que é alcançada pelo autor, já que as situações e contexto levam o leitor a compreender e a dialogar com o texto, mesmo que não concorde com todas as idéias.

4. Coesão

É a manifestação lingüística da coerência. A coesão de um texto é verificada mediante a análise de seus mecanismos lexicais e gramaticais de construção, ou seja, é através dos conectivos como os pronomes, conjunções, advérbios e outros que as idéias vão se organizando dentro do texto de forma que o todo possua sentido. Para que o comentário crítico se realize como um texto predominantemente argumentativo, ele deverá apresentar uma estrutura específica, em que exista uma relação entre argumentos e uma dada conclusão. O exemplo que segue expõe tal característica:

“Por vários anos, manteve-se o silêncio em relação à pedofilia no meio sacerdotal, tudo isso era reprimido simbolicamente, com transferência para outra paróquia, tratamento psicológico ou pagamento de indenização às vítimas. Tal negligência pode ter causado certo estímulo ao agravamento do problema. Entre os direitos, um nos considerados mais importantes é o do voto. O escândalo dos padres pedófilos fez tremer as bases do sistema em voga na Igreja Católica o que pode ter acontecido”.

5. Intertextualidade

Concerne aos fatores que tornam a interpretação de um texto dependente da interpretação de outros. Porventura, cada texto constrói-se, não isoladamente, mas em relação a outro já dito, do qual abstrai alguns aspectos para dar-lhes outra função. O contexto de um texto também pode ser outros textos com os quais se relacionam.
Um exemplo clássico de intertextualidade se encontram nos poemas que aparecem após a “Canção do exílio ‘, de Gonçalves Dias:

Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
(...)

Oswald de Andrade dialoga com ela no “Canto de regresso à pátria”:

Minha terra tem palmeiras
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá.
(...)

6. Intencionalidade

Refere-se ao esforço do produtor do texto em construir uma comunicação eficiente capaz de satisfazer os objetivos de ambos os interlocutores, ou seja, o texto a ser produzido deverá ser compatível com as intenções comunicativas de quem o produz.
O texto é uma unidade da língua em uso ou uma unidade semântica. Nele se constrói o sentido no curso de uma interação, ou seja, nele se constrói o discurso. Este é uma ação verbal movida pela intencionalidade.
Ora, esta intencionalidade implícita do discurso reflete a argumentatividade como uma função da linguagem. Só se interage lingüisticamente movidos por uma intenção argumentativa, portanto qualquer texto, seja dissertativo, narrativo ou descritivo, seja jornalístico, didático ou religioso, seja poético, literário ou infantil, é dotado de argumentatividade em maior ou menor grau. Ou, em outras palavras, é dotado da intenção de atuar

Ex: O cara está jantando e a comida é tão ruim que ele não agüenta:
- Por favor, garçom, eu não consigo engolir a comida, chama o gerente.
- Não adianta. Ele também não vai conseguir.

7. Aceitabilidade

A aceitabilidade constitui a contraparte da intencionalidade.
O texto produzido também deverá ser compatível com a expectativa do receptor em colocar-se diante de um texto coerente, coeso, útil e relevante. A cooperação entre produtor e receptor permite que a comunicação apresente falhas de quantidade e qualidade, sem que haja vazios comunicativos. Isso se dá porque o receptor esforça-se em compreender os textos produzidos, entretanto esse esforço que contribui para o entendimento do texto não é tarefa apenas do receptor, mas também, principalmente, do enunciador.
Com base neste conceito, pode-se verificar no texto que o autor joga com a aceitabilidade do leitor, uma vez que este poderá ou não aceitar a crítica. Vemos exemplos nos seguintes textos:
“Comerciais de carros, de bancos, ou de operadoras de celular ficariam mais úteis se trouxessem mensagens.”
“Não fure a fila, ô mal educado”,
“Jogue a embalagem no lixo, seu porco” ou “Sinal vermelho foi feito para parar, sabia?”

8. Informatividade

É o grau de previsibilidade das informações contidas no texto. Quando ele contém apenas informações previsíveis, o grau de informatividade nele colocado é baixo, mas, se o texto contem também informações não previsíveis, terá um grau maior de informatividade. Dessa forma, quanto maior for o grau de informatividade, maior será o esforço do leitor da decodificação do texto. Em cada texto encontram-se níveis diferentes de informatividade, assim como diz Travaglia & Koch (2004, p. 87): “... tanto em textos poéticos como em textos publicitários ou manchetes jornalísticas, casos de informatividade aparentemente nula, que vai ser promovida a um grau mais alto na seqüência do texto ou na matéria que a manchete encabeça.”
Dessa forma, é através da distribuição das informações contidas no texto que o leitor poderá atribuir o sentido com menor ou maior facilidade, dependendo, é claro, da maneira como são impostas tais informações.
Com base neste conceito, o texto é altamente informativo, o autor dá a ele tanto informações previsíveis quanto imprevisíveis. Através da junção destas informações, o autor leva ao seu receptor a retomada das lembranças daquilo já visto anteriormente, ativando sua reflexão crítica para que ele concorde ou não. Exemplos:
“A moda começou com os cigarros, que precisaram ceder cinco segundos de cada comercial para fazer propaganda eleitoral gratuita das advertências do Ministério da Saúde.”
“No México, acredite, os comerciais dirigidos a crianças precisam trazer alguma mensagem educativa. Os anunciantes podem mostrar os pimpolhos se entupindo de sucrilhos ou de chocolate, desde que no pé da tela corra um letreiro com os dizeres ‘Coma legumes e verduras’ ou ‘Escove os dentes três vezes ao dia’.”

9. Situacionalidade

Trata-se da adequação do texto ao contexto, à situação sociocomunicativa. É importante notar que a situação comunicativa interfere na produção do texto, assim como este tem reflexo do mundo real. O texto deve adequar-se ao momento de produção (real ou imaginário) no qual é redigido; afinal, a situação (o contexto) determina o discurso (religioso, político ), o tipo textual (narração, argumentação ), o gênero textual (carta, artigo ) e a linguagem utilizada (nível formal ou informal, linguagem culta ou coloquial.
Ex: “Se bem que, dada a tradição brasileira, daqui a pouco é muito provável que a palavra moderação siga o mesmo caminho de “pra variar” e “se dar bem”, e acabe significando exatamente o contrário do que dizem os dicionários. Garçom traz mais uma rodada aí - e com bastante moderação!”

ANALISANDO PROPAGANDAS

Partindo da idéia de que a coerência depende muito mais da cognição do leitor/consumidor do que da simples organização dos elementos textuais, a publicidade se vale dessa situação e investe nas propagandas nas suas mais diversas formas , desde um simples letreiro numa fachada até textos mais longos e mais complexos.
O texto publicitário não oferece todos os elementos necessários para a sua compreensão , ou os elementos nele inseridos sugerem muito mais do que o leitor-consumidor necessita para se tornar consumidor em potencial que, para ampliar o conhecimento do usuário insere informações que o leitor precisará ativar seu conhecimento de mundo extralingüísticos e, utilizando-se de estratégias de leitura , atribuir significados para estabelecer o sentido , pois, segundo CARVALHO ( 1996) :

“ os termos que dominamos e conhecemos constituem um patrimônio intelectual , que se amplia de acordo com a intensidade de nossa vivência , de modo a permitir uma compreensão cada vez maior do mundo ( no papel de receptores) e uma quantidade maior de matizes de significados ( no papel de emissores) p.19”
Na propaganda , o texto , seja ele verbal ou simplesmente visual, como é o caso da propaganda 1 não serve apenas para informar ou se referir apenas ao produto anunciado explicitamente, mas pode abordar também as ideologias de uma época ou de um grupo social.
No texto publicitário, a escolha das palavras ou da imagem é feita em decorrência de sua força persuasiva, porque , mais do que argumentar, é necessário envolver o interlocutor no universo criado por ele, introduzi-lo em um mundo de sonhos, desejos, fantasias e desabafos.
A partir do que já foi mencionado acerca do texto publicitário, analisemos a propaganda a seguir e vejamos quanto informação , que ideologia e a que época a propaganda 1 retrata:

Propaganda 1:



Do ponto de vista publicitário, anuncia-se uma marca de jeans e, implicitamente é dito que só o topo da pirâmide social tem acesso a marca já que o pano de fundo é a Explanada dos Ministérios e os modelos se postam na rampa dando idéia de ascensão social.
Um olhar mais atento à imagem percebe-se a intenção do publicitário em explicitar questões como a supremacia masculina sobre a feminina quando, expõe apenas símbolos fálicos como o cabo do rodo e os dois edifícios, inclusive em forma de “H”, vê-se ainda a postura dos modelos quando o homem de pé com a perna sobre a rampa, o braço por trás da cabeça da mulher e esta de joelhos com a cabeça ligeiramente inclinada dando a idéia de que está sendo coagida por ele a realizar uma tarefa de cunho doméstico, tarefa esta que na concepção das pessoas de certa época da evolução humana destinava-se somente à mulher. Por outro lado, o publicitário faz alusão à igualdade entre homens e mulheres quando escolhe modelos de perfis semelhantes.
Para a detecção das informações supracitadas sobre a propaganda em questão, só é possível a partir da ativação da cognição do leitor/consumidor mais atento, pois a atividade de compreensão acontece a partir da identificação de marcas intencionais do autor produzidas por meio de operações de linguagem presentes no discurso. A leitura é um fenômeno complexo que exige do leitor a ativação de diferentes competências. É essa atuação que permite ao homem não apenas comunicar-se, mas essencialmente, agir através da linguagem. Afinal, não falamos apenas para trocar informações sobre o mundo, mas para convencer o outro a entrar no nosso jogo discursivo, para convencê-lo de nossa verdade, recurso usado pelo publicitário para alertar ao público sobre o avanço dos direitos da mulher, o que torna a propaganda coerente quando se vê as questões supracitadas.

10. Argumentação e persuasão

A palavra tem poder de criar e destruir, de prometer e negar, e a publicidade se vale desse recurso como seu principal instrumento.
A função persuasiva na linguagem publicitária consiste em tentar mudar a atitude do receptor. Para isso, ao elaborar o texto publicitário leva em conta o receptor ideal para a mensagem, ou seja, o público para o qual a mensagem está sendo criada. O vocabulário é escolhido no registro refere aos seus usos. Tomando por base o vazio interior de cada ser humano, a mensagem faz ver que falta algo para completar a pessoa: prestígio, amor, sucesso, lazer, vitória. Para completar esse vazio, utiliza palavras adequadas que despertam o desejo de ser feliz, natural de cada ser. Por meio das palavras, o receptor descobre o que lhe faltava, embora logo após a compra sinta a frustração de permanecer insatisfeito.
Em muitas situações de interlocução, o principal objetivo do orador é levar seus ouvintes a agir de uma determinada maneira. Para alcançar esse objetivo, ele precisa aliar bons argumentos a uma fala adequada ao perfil de seus ouvintes/consumidor.
A partir dessa perspectiva, analisemos a seguinte propaganda:

Propaganda 2:

Uma belo dia, uma linda
donzela usou O Boticário.
Depois disso, o dragão
que ela tanto, tanto temia ficou
mansinho, mansinho e nunca
mais saiu de perto dela.
(Linha de cosmético “O Boticário” – Cláudia – fev/04)

Nesse texto, a persuasão constroi-se, também, por meio da intertextualidade de um conto de fadas: “A Bela e a Fera”. O produto anunciado foi introduzido no contexto da história dando nova significação aos elementos do texto original, ativado por meio do conhecimento prévio do leitor/consumidor.

Propaganda 3:

Vista daqui, a Terra é azul.
Como azul é o mundo,
o olhar profundo, o mar.
A vida azul corre mais calma,
embora as horas não parem.
Relógio Safira H. Stern.
O tempo é azul.
Preciosamente azul.
(Relógio Safira H. Stern – Elle – Nov/97)

A escolha cuidadosa das palavras traduz a força persuasiva do anunciador, que explora a intertextualidade (o momento em que o homem chegou à lua) e complementa, ao final, com o uso de um modalizador. A repetição do adjetivo azul, em um jogo com o azul da pedra safira, intensifica a intenção argumentativa de explorar as qualidades do produto anunciado.o modalizador afetivo preciosamente ressalta as potencialidades semânticas assumidas pela palavra azul no decorrer do texto e a utilização, no fechamento da propaganda caracteriza o caráter emocional no momento em que adverbializa o adjetivo precioso, cuja carga semântica possui conotação altamente positivas.

Propaganda 4:

Para começo de conversa, analisemos os significados das palavras VISUAL e ELEGÂNCIA.
Segundo o dicionário da Língua Portuguesa “Mini Aurélio”, o verbete da página 754 da 5º edição diz:


Na página 274 do mesmo dicionário, encontra-se:
Partindo agora para análise do nome e o slogan do estabelecimento, vê-se do ponto de vista gramatical e semântico, que as Visual e Elegância não possuem nenhuma semelhança uma vez que a primeira é um adjetivo d dois gêneros e se refere ao aspecto físico, enquanto a segunda se trata de um substantivo feminino e se refere muito mais a aspectos psicológicos.
Aparentemente, não se trata de palavras que apresentam coerência já que pertencem a classes gramaticais diferentes e tratam de situações distintas, porém do ponto de vista lingüístico e, a partir da cognição do leitor/consumidor é possível encontrar coerência uma vez que é por meio da base sensorial do indivíduo (um deles- a visão) que se percebe o quão elegante um ser pode estar. A partir dessa perspectiva a coerência é estabelecida mesmo havendo dicotomias entre os constituintes do texto.

Propaganda 5:



Percebe-se como a chamada e o texto do anúncio sugerem que a revista anunciada é um publicação séria, que investiga as questões com profundidade. Por isso, estar na sua capa significa estar envolvido em situações importantes (e desgastantes) para vida do país. O texto abaixo da propaganda diz o seguinte:
“Notícias exclusivas. A análise da situação (e da posição também). Independência, coragem, e um faro donado para descobrir mutretas.Reportagens e artigos deliciosamente bem escritos. Nas colunas animadas, nenhum achólogo, nenhum palpitólogo, só especialistas. Leia CARTACAPITAL: Como todo mundo você vai saber o que aconteceu na semana. Mas, como poucos, vai ter elementos para saber o que pode acontecer nas semanas que vem aí”
Nota-se que o princípio da propaganda é enfatizar a qualidade das notícias e dos textos publicitários na revista. A propaganda busca diferenciar a revista em questão das demais revistas, ao definir a publicação como extremamente bem escrita e sem “achólogos” ou “palpitólogos” escrevendo, nas colunas. Ou seja, o que está implícito é que os colunistas da revista sabem ao certo do que estão falando, ao contrário daqueles que apenas acham ou palpitam.Esta qualidade editorial CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 6
permitiria ao leitor de CARTACAPITAL também se diferenciar dos demais leitores: ao contrário dos leitores de outras revistas semanais, o leitor de CARTACAPITAL não sabe apenas o que ocorreu na semana, mas sabe também o que pode ocorrer nas próximas semanas, graças à qualidade das informações contidas na revista. Só esta publicação poderia fornecer subsídios para o leitor analisar também cenários futuros de temas políticos, econômicos e culturais que se apresentam no momento presente.
Um leitor inteligente não gosta apenas de ser informado sobre o que ocorreu de forma superficial. Gosta de análises profundas dos fatos, de novas perspectivas sobre os temas semanais. O leitor gosta de ser respeitado como alguém capaz de formar sua própria opinião, sobre o presente e sobre o futuro.
De certa forma, a sugestão é que leitores da revista anunciada são mais inteligentes, tem maior autonomia de leitura, pois se diferenciam da maioria dos que lêem publicações trazendo apenas um levantamento dos fatos ocorridos na semana anterior. Essa é certamente uma imagem positiva que qualquer pessoa gostaria de ter de si mesma e o recurso persuasivo do texto investe justamente nessa imagem.
A partir da análise acima, percebe-se que a coerência na publicidade está atrelada mais a cognição do leitor/consumidor do que simplesmente na organização dos constituintes publicitários.

Propaganda 6:


A propaganda acima tem como objetivo a conscientização dos fumantes sobre os malefícios do cigarro e utiliza como estratégia persuasiva a análise dos “truques” utilizados pelos anúncios de cigarro para vender um produto que, comprovadamente, faz mal à saúde, além de apresentar informações e dados estatísticos sobre os malefícios causados pelo cigarro. Em primeiro lugar, aparece uma propaganda fictícia de cigarro com o que é característico desse anúncio e, depois, a análise dos recursos utilizados na propaganda (gente jovem e bonita) para construir uma imagem positiva do fumante, baseada no perfil do consumidor que desejam atingir.
A coerência publicitária pretendida pelo publicitário se dá a partir da imagem analisada na propaganda do Ministério da saúde, há a referência ao fato de “a comunicação do cigarro ser sempre moderna e dirigida para o público jovem” em função dos dados estatísticos atestando que 90% dos fumantes começam a fumar antes dos 19 anos. Além disso, estabelece-se uma relação entre sempre aparecer gente bonita e saudável nas propagandas de cigarro, e a insatisfação da maior parte das pessoas com o próprio corpo, indicando uma estratégia para vender o produto o desejo das pessoas de se sentirem como os modelos dos anúncios de cigarro.


11. Conclusão
Diante do exposto, é possível concluir que colocar em cena, nas carteiras escolares, os recursos argumentativos, persuasivos e as estratégias de leitura forneceria, possivelmente, ferramentas para que o aluno pudesse compreender e argumentar com mais segurança e, sobretudo, com mais criatividade e criticidade.
Em outros termos, possibilitaria ao aluno obter maior êxito no ato de ler e, sobretudo, entender a diversificação de visão de mundo e as formas de enunciação, além de aprender 16 a conviver e a buscar outras posições ideológicas permitindo o exercício democrático e de cidadania.
Conclui-se ainda que o texto publicitário requer a ativação dos conhecimentos prévios do leitor/consumidor para que este interaja com maior diversidade textual, inclusive propagandas. 



 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


CARVALHO, N. de. Criação da propaganda. São Paulo: Golbal,1987.


GODOYLADEIRA, J.  Argumentação e Linguagem. São Paulo: Cortez, 1984.

KOCH, I.G. V. O texto e a construção dos sentidos. São Paulo: Contexto, 1997.

________. Texto e coerência. São Paulo: Cortez Editora.

KOCH, I.G. V. & TRAVAGLIA, L. C. (1989) A coerência textual. 6.e 16º ed. São Paulo: Contexto. 1995;2004.

________.
Publicidade – A linguagem da sedução. São Paulo: Ática, 2000.




www2.uel.br/revistas/entretextos/volume9/pdf/07.pdf

www3.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/cd/Port/108.pdf

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